Kimberly sofria de uma grave doença. Em meio a sua própria batalha, ela descobriu que sue filho também estava seriamente doente. Leia mais!
Rayane Santos | 4 de Novembro de 2021 às 11:00
Kimberly Macurdy sempre teve problemas de visão. Começou a usar óculos ainda pequena, e as lentes foram ficando cada vez mais fortes. Nas últimas décadas, a mãe de três filhos de 57 anos ia tão mal nos exames de vista que os optometristas, incrédulos, lhe pediam que parasse de brincar e prestasse atenção.
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Em 2008, a piora súbita levou Kimberly a desconfiar que lidava com algo mais do que a perda comum de visão. Certo dia, sentada na cozinha de casa, ao norte de Houston, no Texas, Kimberly não conseguiu ler a hora no micro-ondas no outro lado do cômodo, mesmo de óculos. No emprego de gerente de compras de uma fábrica, foi ficando mais difícil focalizar as planilhas que estavam bem à sua frente.
O optometrista de Kimberly não conseguia descobrir o que causava os sintomas, nem a série de especialistas que a examinaram no ano seguinte. Alguns médicos acharam que a explicação mais provável era que ela estava estressada e imaginando os sintomas, dada a situação familiar: mais ou menos na mesma época, seu filho mais novo, Braden, de 7 anos, foi três vezes ao pronto-socorro com vômito, febre e desidratação grave. Mas ela insistia que não estava inventando nada e continuou buscando novas opiniões.
Em 2009, Kimberly consultou o Dr. Andrew Lee, chefe de Oftalmologia do Instituto de Olhos Blanton, do Hospital Metodista de Houston. Certa noite, pouco antes da consulta, quando se preparava para dormir, ela teve uma convulsão: caiu no chão e se debateu incontrolavelmente. Conseguiu subir na cama, onde depois acordou numa poça de urina.
Kimberly já tivera convulsões, mas essa a levou a fazer uma lista dos outros problemas persistentes de saúde: artrite reumatoide, mancar, febre recorrente e os problemas de visão que só tinham piorado. Ela começou a ter visão dupla e a sentir tremores nos olhos. “Era como se meus olhos ricocheteassem como bolas de basquete”, diz ela.
Kimberly mandou a lista ao médico, na esperança de que ele ligasse os pontos. Quando chegou ao consultório, ela ficou impressionada ao ver como ele entendeu depressa sua situação. Ele não sabia o que afligia Kimberly, mas tinha um palpite: esclerose múltipla.
A esclerose múltipla faz o sistema imunológico atacar a mielina, o tecido gorduroso que reveste e protege os nervos, e isso pode resultar em problemas de visão. Depois da consulta, Kimberly sentou-se no carro e chorou – não pela possibilidade de ter esclerose múltipla, mas por saber o que estava errado com ela.
Mais tarde, uma ressonância confirmou a hipótese do médico: a mielinização do cérebro de Kimberly era anormal, ou seja, provavelmente era esclerose múltipla, embora não haja um exame definitivo para comprovar a doença. A esclerose múltipla não tem cura, mas os médicos de Kimberly lhe receitaram alguns remédios para tratar os sintomas e a mandaram para casa.
Mais ou menos na época em que Kimberly começou a obter respostas, o mesmo aconteceu com o filho. Um endocrinologista conjeturou que os problemas de saúde de Braden eram causados por uma disfunção das suprarrenais, que produzem os esteroides naturais de que o corpo precisa para excretar o excesso de potássio. O médico lhe receitou hidrocortisona para equilibrar a química do corpo.
Nos cinco anos seguintes, Kimberly e o filho apenas sobreviveram. Juntos, tinham pelo menos uma consulta médica por semana. Os medicamentos iniciais para esclerose múltipla de Kimberly não funcionaram tão bem quanto esperado, e os médicos receitaram outros. Ela estava sobrecarregada, tentando equilibrar sua saúde e a de Braden.
“A vida era superesquisita”, diz ela. “Eu continuava ladeira abaixo.”
Em 2015, Braden voltou ao hospital depois de outra crise de vômito. Kimberly insistiu com os médicos para fazerem exames adicionais e descobrir por que o filho estava doente. Em 2016, o resultado de um exame genético revelou que Braden tinha uma mutação num gene que, normalmente, ajuda as células a decompor os ácidos graxos de cadeia muito longa. Esses ácidos graxos isolam as fibras nervosas do cérebro, mas seu excesso estava prejudicando a mielina do corpo todo.
A doença se chama adrenoleucodistrofia (ALD), afeta cerca de uma em cada 20 mil pessoas e não tem cura. Alguns portadores são assintomáticos e têm vida plena, outros morrem na adolescência. Quando Braden, então com 15 anos, perguntou aos médicos quanto tempo viveria, eles responderam: “Não sabemos.”
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Foi um diagnóstico arrasador, mas teve um lado bom. Quando voltou ao consultório de Lee, Kimberly mencionou por acaso o diagnóstico do filho. “Ele literalmente parou a caneta no meio do papel e disse: ‘Espere aí’”, conta Kimberly. Lee achou que a ALD, uma doença genética, podia explicar o problema dela. Realmente, além da esclerose múltipla, um exame genético revelou que ela apresentava a mesma mutação do filho. Os dois mistérios na verdade eram um só.
A ALD está ligada ao cromossomo X e, assim, se manifesta primariamente em homens. “Por isso o filho mostrava todos os sintomas, e nele o diagnóstico foi óbvio”, diz Lee. É bem mais raro que as mulheres apresentem sintomas de ALD porque têm dois cromossomos X, e um serve de becape caso o outro seja afetado pela mutação. Assim, as portadoras de ALD têm sintomas mais leves ou nenhum sintoma.
Depois do diagnóstico, Kimberly procurou um especialista em ALD na Clínica Mayo, em Rochester, no estado de Minnesota. Agora, esse médico vê Kimberly e Braden pelo menos uma vez por ano para fazer exames e monitorar sinais de alerta, para que a doença não progrida.
Depois de uma vida inteira com sintomas desconcertantes, Kimberly está aliviada por saber o que ela e o filho enfrentam. “Se eu não forçasse os médicos a procurar, ainda não saberíamos”, diz ela. “Mas não sou nenhuma heroína. As mães fazem o que têm de fazer.”
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