Ainda existem pais que acreditam que a vacinação infantil é opcional. No entanto, as leis brasileiras consideram a vacinação infantil uma obrigação legal.
Samasse Leal | 31 de Agosto de 2020 às 18:00
Ainda existem pais que acreditam que a decisão sobre vacinar ou não seus filhos é pessoal. No entanto, as leis brasileiras consideram que o interesse público envolvido na vacinação se impõe sobre o interesse pessoal. Por isso, a vacinação infantil passa a ser uma obrigação legal. E essa é sem dúvidas o entendimento da maioria dos juristas brasileiros.
O objetivo das leis é garantir a saúde e a segurança de toda a população. Por isso são criadas políticas públicas que preveem campanhas de vacinação e sua obrigatoriedade. Comprovadamente, a vacinação em massa é capaz de extinguir doenças.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei 8.069/90, foi criado em 1990. Seguindo o direito à saúde previsto na Constituição Federal, essa lei especial defende a proteção integral às crianças e adolescentes. Assim, prevê que “é obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias”. A determinação está descrita no parágrafo 1º do artigo 14 dessa lei.
É no artigo 249 que o ECA prevê as penalidades para os responsáveis que deixarem de cumprir suas obrigações. Assim, deixar de cumprir os deveres do poder familiar, da tutela ou guarda, resulta no pagamento de multa de 03 a 20 salários de referência. Se houver reincidência, a multa será aplicada em dobro. E não importa se os responsáveis não tiveram culpa pelo erro, ou se tiveram ou não intenção.
Cumprir o Calendário Nacional de Vacinação é uma obrigação dos responsáveis, prevista no artigo 14 mencionado acima. Portanto, esquecer de vacinar os filhos ou deixar de vaciná-los por motivo de viagem, por exemplo, não isenta da penalidade.
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Caso a criança tenha alguma contraindicação temporária à vacinação, como febre, assim que se recuperar, ela deve ser vacinada. Portanto, tão logo seja possível, a criança ou adolescente devem ser vacinados.
Diversas outras leis também preveem essa obrigação e como ela deve ser cumprida. A Lei 6.259/75 criou o Programa Nacional de Imunizações (PNI), instituindo a política pública nacional de vacinação. Essa lei dispõe também sobre as ações de Vigilância Epidemiológica e estabelece regras sobre obrigação de notificação de doenças.
O Decreto 78.231/1976, responsável por regulamentar a Lei 9.259/75, prevê regras ainda mais específicas. O artigo 43 determina que não cumprir as obrigações da Lei 6.259 é uma infração, e por isso há penalidades. Notificar sobre a ocorrência de doenças é uma obrigação dos serviços de saúde, públicos e privados em todo o país. Portanto, os serviços de saúde devem notificar sobre a ocorrência de doenças que podem ser prevenidas por vacinas.
Existem ainda os crimes contra a saúde pública, previstos nos artigos 267 a 269 do Código Penal.
Uma denúncia de maus tratos a uma criança ou adolescente pode ser levada a um julgamento. O Juiz da Vara de Infância e Juventude avaliará os cuidados que o menor recebe no seio familiar. A falta de vacinação pode ser um dos critérios nessa avaliação. Assim, pode ser determinante da decisão sobre a perda da guarda ou do poder familiar, além de outras penalidades aplicáveis.
Atualmente, as escolas podem exigir a caderneta de vacinação para matrícula de crianças até o 5º ano do ensino fundamental. Sejam elas públicas ou privadas. E elas podem informar ao Conselho Tutelar caso os pais não entreguem o documento. Essa é uma orientação conjunta do Ministério da Saúde e do Ministério da Educação no Programa Saúde na escola. Esse programa prevê ações voltadas à prevenção e promoção da saúde nas salas de aula.
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Caso os cientistas descubram uma vacina contra a Covid-19, ela será obrigatória? Políticas públicas poderão definir a obrigatoriedade ou não da vacina e se ela será incluída no calendário oficial de vacinação. Enquanto não for criada uma vacina segura, confiável e com eficácia comprovada, ela não poderá ser obrigatória. Nenhuma pessoa pode ser obrigada a servir como cobaia para o desenvolvimento de vacinas ou remédios. Essa disponibilidade deve ser voluntária.
Em 1998 foi criada a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm). Ela é uma entidade científica sem fins lucrativos que atua junto aos órgãos públicos. Uma de suas missões é participar das decisões do PNI e defender a regulamentação da atividade de vacinação.
A SBIm publicou em um artigo extenso sobre a importância e a obrigatoriedade da vacinação. O artigo destaca o alerta da Organização Mundial de Saúde (OMS) após um surto de sarampo em 07 países europeus. Aponta dados sobre o surto de febre amarela, com mais de 200 mortes, no Brasil em 2019. De acordo com os dados citados, “o Ministério da Saúde registrou uma redução na taxa de cobertura de alguns imunizantes. (…) em 2016, a segunda dose da vacina tríplice viral, que protege contra sarampo, caxumba e rubéola, atingiu 76,7% do público-alvo”. O artigo comenta também sobre os perigos dos movimentos “antivacinas”.
Esses movimentos costumam basear sua filosofia na ideia de que os pais deveriam decidir individualmente sobre vacinar seus filhos. Afirmam que vacinas não são seguras e podem causar a doença que pretende combater. O mesmo artigo da SBIm comenta inclusive sobre um caso de informações falsas divulgadas por esses movimentos.
Muitas informações incorretas são amplamente compartilhadas em redes sociais. Portanto, é necessário se informar em órgãos oficiais sobre saúde e vacinas.
De acordo com o site do Governo Federal para divulgação do PNI, o sucesso do Programa é reconhecido mundialmente. Através dele são distribuídas por ano mais de 300 milhões de doses em vacinas, soros e imunoglobulinas no país. Essa medida contribuiu, por exemplo, para a erradicação de doenças como a varíola e a poliomielite. Também possibilitou a redução dos casos e mortes decorrentes de sarampo, rubéola, tétano, difteria e da coqueluche.
É o PNI quem define os calendários e prevê a realização de Campanha de Vacinação em todo o país. De acordo com o site do Governo Federal, o programa considera a situação epidemiológica, o risco, a vulnerabilidade e as especificidades sociais.
Ele define orientações específicas para crianças, adolescentes, adultos, gestantes, idosos e povos indígenas.
No nascimento, todas as crianças recebem a caderneta de vacinação, nos hospitais públicos e particulares. Na caderneta constam as vacinas já incluídas no programa de vacinação do Governo. Campos em branco devem ser preenchidos com doses em Campanhas e outras vacinas incluídas posteriormente no Programa.
A vacina contra Meningite ACWY, por exemplo, somente foi incluída no calendário de vacinação em 2020. Devem ser imunizadas crianças com idade entre 11 e 12 anos de idade. Contudo, pediatras recomendam que ela seja aplicada ainda na primeira infância (até os 5 anos de idade). Ela pode ser aplicada em clínicas particulares e o custo não pode ser abatido no imposto de renda. Nesse caso, os pais devem arcar com os custos em benefício da saúde dos filhos.
De acordo com o site do PNI:
“Para que o programa continue representando um sucesso na saúde pública, cada vez mais esforços devem ser despendidos. Todas as doenças prevenidas pelas vacinas que constam no calendário de vacinação, se não forem alvo de ações prioritárias, podem voltar a se tornar recorrentes”.