Afinal de contas, relacionamento no trabalho é ou não é proibido? Se você também sobre com essa dúvida, veja o que dizem os especialistas.
Amanda Santos | 10 de Novembro de 2019 às 14:30
Onde se ganha o pão não se come a carne. O ditado, que se refere ao profissional que não deve manter relacionamento no trabalho, é seguido à risca no McDonald’s. A prova disso foi a demissão de seu presidente-executivo, o britânico Steve Easterbrook, após a empresa descobrir que ele mantinha um namoro com uma funcionária.
No entanto, especialistas brasileiros afirmam que o ditado não precisa ser interpretada ao pé da letra. Segundo eles, o ponto crítico de um relacionamento com outro funcionário da mesma empresa está na possibilidade de haver uma hierarquia entre os envolvidos, como casos de relação entre chefe e subordinado.
“São políticas globais de normas de conduta e as empresas brasileiras acabam replicando isso aqui. Mas o que eu vejo é que a regra restringe um relacionamento entre funcionários quando existe uma relação de subordinação”, afirma Henrique Melo, sócio do NHMF Advogados.
Para o advogado e professor de direito do trabalho Ricardo Calcini, o objetivo da regra é evitar que alguns funcionários levem vantagens sobre outros. “A ideia que está por trás dessa regra é que se relacionar com alguém superior a você, em tese, pode ter certo favorecimento comparado aos demais funcionários”, diz.
Já no caso específico do presidente da rede de fast-food, os especialistas afirmam que o relacionamento de Easterbrook com algum empregado da empresa o colocaria em uma situação delicada, porque qualquer funcionário estaria subordinado ao seu comando.
“A recomendação para as empresas é tentar acomodar a situação. Talvez fazer uma mudança de setor para quebrar a relação de hierarquia. No caso do presidente, não tem como transferir, então aí fica uma situação difícil mesmo”, afirma Melo.
No Brasil, não há um entendimento legal sobre processos judiciais relativos a demissões de funcionários que tiveram relação com outro empregado da empresa, afirma Calcini. Segundo o advogado, há decisões do TST (Tribunal Superior do Trabalho) favoráveis e contrárias aos trabalhadores.
“Uma relação entre pessoas de hierarquias diferentes não é algo bem-visto dentro da empresa. No caso, voltamos à questão do favorecimento. Mas proibir relacionamento entre pessoas de mesma hierarquia pode violar o direito da pessoa de se relacionar com quem ela quiser”, diz.
O advogado Henrique Melo destaca o direito constitucional à intimidade. “O direito de intimidade e vida privada é constitucional. Você pode ter essas diretrizes, mas tem que ser razoável e tomar cuidado para não violar direitos”, afirma.
Para Daniela Diniz, diretora da Great Place To Work (Ótimo Lugar Para Trabalhar, em português), mesmo não havendo dados compilados sobre relacionamento no trabalho no Brasil, é possível perceber de maneira informal que as empresas são mais flexíveis com esse ponto por aqui.
“O brasileiro é muito mais flexível. Há empresas em que até se comemora”, diz. Porém, Daniela ressalta que o funcionário de uma multinacional precisa manter sempre em mente as regras e a cultura do país da matriz.
“O caso do Salesforce, da festa a fantasia de fim de ano, é um exemplo que explica a diferença de cultura entre os países. Aqui, tudo foi permitido, e os líderes até tomaram as dores do funcionário. Mas o que a matriz decidiu fazer? Demitir todo o mundo porque havia uma violação do código da matriz”, lembra.
ARTHUR CAGLIARI/FOLHAPRESS