O consumidor fica atraído por promoções e precisa ter cuidado na hora de comprar para não ser pego por uma falsa redução dos valores.
Elen Ribera | 21 de Fevereiro de 2020 às 20:00
Há duas razões para que até o consumidor mais consciente caia nos truques do varejo. Primeira: ele não sabe quanto tudo deveria custar, e assim o cérebro comprador usa apenas o que é capaz de perceber: dicas visuais, emoções provocadas e a sensação de pechincha ou de exploração. Somos apenas suscetíveis. Segunda: embora gastemos um dinheiro contado, tomamos decisões com base em pistas e semipensamentos que se traduzem num analfabetismo numérico.
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Por Derek Thompson
Você entra numa padaria e vê duas ofertas: a primeira oferece 33% de café a mais pelo mesmo preço; a segunda é um desconto de 33% no preço normal. Qual delas é melhor? Se você responder que são praticamente iguais, vai errar. Imaginemos um mundo no qual três litros de café custem R$ 1 (R$ 0,33 o litro).
Na primeira oferta, você compra quatro litros por R$ 1 (R$ 0,25 o litro) e na segunda, e melhor, você compra três litros por R$ 0,66 (R$ 0,22 o litro). O que fazemos é a matemática emocional: receber alguma coisa a mais “de graça” dá uma sensação melhor do que obter o mesmo por menos.
Você entra numa loja chique e vê uma bolsa de R$ 7 mil. “Que absurdo!”, diz. “Sete mil por uma bolsa!” Então vê um relógio lindo por R$ 900. Comparado a outros, é um relógio caríssimo. Mas, comparado a R$ 7 mil, é uma pechincha. Dessa maneira, as lojas “massageiam” ou “ancoram” as nossas expectativas de gasto.
Pesquisadores ofereceram a voluntários dois tipos de cerveja: premium por R$ 2,50, e outra, baratinha, por R$ 1,80. Cerca de 80% escolheram a cerveja mais cara. Depois foi adicionada uma terceira cerveja, baratíssima, por R$ 1,60. O resultado foi: 80% escolheram a cerveja de R$ 1,80; o restante comprou a cerveja de R$ 2,50.
Ninguém comprou a opção mais barata. No terceiro painel, os pesquisadores retiraram a cerveja de R$ 1,60 e a substituíram por uma superpremium de R$ 3,40. A maioria escolheu a de R$ 2,50; um pequeno número, a de R$ 1,80; e cerca de 10% optaram pela cerveja mais cara. Em resumo: gostamos de ficar na média. 10 dicas para negociar melhor e pagar menos.
No livro Priceless (Sem preço), o escritor americano William Poundstone explica o que aconteceu quando uma grande empresa varejista pôs uma máquina de fazer pão de US$ 429 ao lado do modelo que custava US$ 279: a venda do modelo mais barato dobrou, embora praticamente ninguém comprasse o modelo de US$ 429.
Lição: quando não conseguir vender um produto, tente expô-lo ao lado de algo quase igual mas com o dobro do preço. Isso fará o primeiro produto parecer uma pechincha. Você precisa mesmo comprar?
Os economistas comportamentais adoram fazer experiências em escolas e descobriram que acender luzes sobre frutas e pôr um balcão de saladas no caminho dos doces faz as crianças comerem mais frutas e saladas. Mas os adultos são igualmente suscetíveis a esses truques. Restaurantes astutos, por exemplo, usam coisas simples como fotos e quadros nos cardápios a fim de atrair os olhos para os itens mais lucrativos.
Quando um item do cardápio estiver em destaque num quadro, ou for ilustrado, provavelmente é um produto com margem de lucro elevada que o restaurante torce para que você veja e peça.
Numa experiência mencionada no livro de William Poundstone, oferece-se aos voluntários uma certa quantia em dólar, entre 1 a 10. Os valores considerados baixos “demais” (digamos, US$ 1) ativaram o córtex insular, “que costuma ser estimulado pela dor e pelo mau cheiro”. Quando nos sentimos explorados, ficamos indignados, mesmo se a oferta for boa. Poundstone iguala isso à experiência do frigobar.
É tarde, você está com fome, há um chocolate lá, mas você se ofende tanto com o preço alto que passa fome para evitar a sensação de ser explorado. O outro lado da moeda é que as pechinchas fazem a gente se sentir bem. Até o item mais inútil do mundo fica atraente se o preço parecer baixíssimo.
Quando estamos bêbados, estressados, cansados ou desatentos por alguma outra razão, é mais provável só conseguirmos fazer e responder às perguntas mais simples sobre as compras. Chocolates e chicletes baratos ficam perto do caixa do supermercado porque é quando aumenta a probabilidade de fregueses exaustos cederem a tentações sem prestar atenção ao preço.
Almoços com bebidas são bons para fechar acordos comerciais porque o álcool estreita a faixa de fatores complicadores que conseguimos manter na cabeça ao mesmo tempo.
Numa coluna sobre finanças pessoais, a jornalista Megan McArdle implorou aos leitores que abandonassem pagamentos regulares, como filiação a academias e serviços que não usam. “Não compre o que você não consome” parece um conselho óbvio, mas Megan tem razão.
Em parte, assinaturas e filiações nos atraem porque buscamos evitar o custo da transação. Preferimos pagar um pouco mais do que sofrer a dor psicológica de puxar a carteira e ver o dinheiro diminuir a cada sessão na academia, ida ao cinema etc.
Embora os consumidores tentem evitar pagamentos adicionais, há um que adoramos: garantias. Ela compra paz de espírito (“Agora posso ter essa coisa para sempre sem me preocupar com ela!”). Mas isso é mais um truque. “Em termos racionais, as garantias não fazem sentido”, disse ao Washington Post David Cutler, economista de Harvard. “A probabilidade implícita de que o produto enguice tem de ser substancialmente maior que o risco de que você não possa pagar pelo conserto ou pela substituição.” Como observa Cutler, a garantia geralmente não vale o dinheiro pago a mais. Você já ouviu falar da Dieta do Cartão de Crédito?
Até 65% de todos os preços do varejo terminam em 9. Por quê? Todo mundo sabe que R$ 20 e R$ 19,99 são a mesma coisa. Mas o número 9 nos conta uma história simples: este produto teve um desconto. Ele é barato. O preço deste produto foi dado por quem sabe que a gente gosta de coisas baratas e com desconto. Esse recurso é apenas mais uma armadilha.