Os aparelhos auditivos de hoje são muito diferentes dos modelos de 15 anos atrás. Com a tecnologia digital, aumentou o uso desses aparelhos.
Redação | 15 de Dezembro de 2018 às 13:00
Muitas pessoas se recusam a usar o aparelho auditivo porque parecerão mais velhas do que são e podem ser motivo de chacota. Não há quem faça uma pessoa usá-lo contra a vontade.
Aos 42 anos, Bjarne Larsen, de Fredericia, na Dinamarca, começou a perder a audição. Primeiro, não conseguia mais ouvir o bipe de alta frequência da câmera fotográfica nem o canto das cigarras. Depois, não conseguia mais ouvir quem estivesse diante dele em salas barulhentas. Larsen só fez exames de audição aos 50 anos, por sugestão dos amigos incomodados. Precisou de aparelho auditivo, e o usa desde então.
“A primeira vez que usei o aparelho, lembro-me de ter ficado impressionado com os muitos sons do tráfego e o canto dos pássaros”, diz Larsen, hoje com 59 anos. “Sinto-me mais à vontade em situações sociais, dada a maior facilidade para acompanhar a conversa. Quando não entendemos uma palavra porque não conseguimos ouvir (leia mais sobre os sentidos), os outros nos consideram meio lentos, ou então viramos assunto de piadas.”
Em geral, a audição começa a piorar por volta dos 50 anos, como consequência natural do envelhecimento. (O diabete e problemas cardíacos como a hipertensão podem contribuir, assim como a exposição prolongada a ruídos.) Aos 65 anos, um de cada quatro europeus está meio surdo. Aos 75 anos, esse número pula para um em três, de acordo com a Federação Europeia de Surdez e Deficiência Auditiva (EFHOH, na sigla do nome em inglês), entidade sem fins lucrativos que dá apoio a europeus com esse problema.
Os exames e o uso de intervenções como os aparelhos auditivos podem ajudar, mas muitos se recusam devido ao estigma dessa deficiência. “É comum achar que os outros vão considerar burro e velho demais quem precisa de aparelho auditivo”, diz Kim Ruberg, secretário-geral da entidade sem fins lucrativos Hear-It, com sede em Bruxelas. “Isso é ridículo. A deficiência é natural e não tem absolutamente nada a ver com inteligência.”
Os especialistas recomendam fazer exames pelo menos de três em três anos depois dos 50 e usar aparelhos caso a perda auditiva chegue a 25 decibéis no ouvido pior. Mas não há diretrizes oficiais para os exames, que em geral os médicos não pedem nem os pacientes tomam a iniciativa de fazer.
“Não se pode dizer a um paciente adulto que ele tem de fazer o exame”, diz Ad Snik, pesquisador do grupo de audição e implantes do Centro Médico da Universidade Radboud, na Holanda. “Ele pode tomar decisões por conta própria.”
Eis uma razão importante para monitorar a audição: pesquisas ligaram as deficiências auditivas à depressão, à demência e aos problemas cognitivos. Um estudo de 2013 publicado na revista JAMA Internal Medicine verificou que adultos mais velhos com perda auditiva tinham probabilidade 24% maior de apresentar deficiência cognitiva do que adultos com audição normal. O isolamento social ligado ao problema auditivo costuma provocar depressão: fica dificílimo entender os amigos em restaurantes barulhentos ou festas cheias. “Eles evitam esses lugares e talvez percam amigos”, diz Snik. “E, para um idoso, não é fácil recuperar o que perdeu.”
A deficiência cognitiva é mais comum em idosos com dificuldade de audição, mas talvez uma não seja causa da outra. “Quando há declínio da função cerebral, talvez a capacidade das vias cerebrais de processar o som também seja afetada”, diz Gary Housley, diretor do Departamento de Fisiologia da Escola de Ciências Médicas da Universidade de Nova Gales do Sul, em Sydney, na Austrália.
Apenas uma pequena percentagem dos que precisam de aparelhos consegue obtê-los. Em países como Dinamarca e Noruega, onde os pacientes os recebem gratuitamente, uma em cada cinco pessoas com deficiência auditiva tem o aparelho. Já em países como França e Espanha, onde o paciente cobre quase todo o custo, esse número é de menos de uma em dez pessoas, segundo a EFHOH.
Os estudos mostram que muitos proprietários de aparelhos auditivos não os usam. Alguns não ficam satisfeitos com a qualidade do som. Outros esquecem de trocar a bateria. Algumas pessoas socialmente isoladas não se importam, porque ninguém fala com elas. Em muitos casos, a vaidade e o medo as mantêm no silêncio.
Os aparelhos de hoje são muito diferentes dos modelos de 15 anos atrás. “Isso significa que existem novos aparelhos digitais baseados na microeletrônica, com chips de computador, microfones mais sofisticados, programas de redução de ruído, programas de direcionalidade e transmissão de áudio sem fio”, explica Rikke Schnack-Petersen, presidente da Associação Dinamarquesa de Audiologia Médica.
Muitos aparelhos auditivos incorporam tecnologia externa para melhorar a experiência. “Alguns usam tecnologia sem fio ou Bluetooth para se comunicar com o celular ou com alto-falantes em ambientes especiais, como auditórios”, explica Priya Singh, diretora de Educação do Instituto de Audição da University College de Londres.
Alguns aparelhos facilitam a audição de vozes humanas, música ou a pessoa mais próxima. Outros ajustam automaticamente o volume com base no ruído de fundo. “Isso aumentou tremendamente o uso e a satisfação com os aparelhos auditivos”, explica Ruberg.
Os modelos retroauriculares, aqueles usados atrás da orelha, se tornaram populares. Um tubo fino entra no canal auditivo e permite o fluxo de ar, ao contrário dos modelos completamente internos, que impedem a ventilação. “Quem tem muita perda auditiva pode usar uma peça maior atrás da orelha, com mais poder de processamento computacional”, diz Ruberg.
Bjarne Larsen usa aparelhos auditivos retroauriculares com dispositivo de transmissão. Ele ouve vozes ou música recebidas de seu iPhone via Bluetooth. Os próximos aparelhos podem ser ainda mais sofisticados. “Aí, espero poder interligar a TV, o aparelho de som e o rádio ao aparelho auditivo sem precisar de um cabo em torno do pescoço”, imagina ele. “A alegria que tenho com meus aparelhos fica evidente diante do quase pânico que sinto quando a carga da bateria acaba e não estou em casa!”