Síndrome do pânico, ou transtorno do pânico, tem tratamento e cura. Procure ajuda médica com o auxílio das pessoas mais próximas.
Redação | 29 de Janeiro de 2019 às 14:00
Transtorno do pânico, ou síndrome do pânico, como é mais conhecida no Brasil, acontece quando o medo impede a pessoa de fazer alguma coisa que seja do seu cotidiano. Quem sente o pânico sabe que ele pode aparecer de uma hora para outra, sem aviso. Aliás, são muitos os gatilhos que transformam simples apreensões em medos irracionais.
Sempre aconteceu, mas havia o sentimento de vergonha por sentir um medo extremo, e ninguém comentava. Hoje, personalidades como a modelo Gisele Bündchen, que escreveu o livro Aprendizados: Minha caminhada para uma vida com mais significado, e o padre Fábio de Melo trazem suas experiências a público, assumem sofrer de pânico e dizem que procuraram ajuda.
Isto é, o mais importante é saber que você não está sozinho e que a cura é real. A seguir o relato de Bonnie Munday, que encontrou a saída para o seu medo irracional de dirigir em autoestradas.
ζ
São seis horas de uma tarde de setembro de 2001, e estou ao volante de nossa minivan verde numa autoestrada de Toronto. Tenho 36 anos e vou jantar na casa de meus pais. Meu marido está nas Bermudas há três semanas, onde fechou um contrato de dois anos e procura apartamento para que eu vá ficar com ele e continuar a distância meu trabalho de redatora. Assim, sou só eu e nosso poddle preto, enroladinho no banco do passageiro, no percurso de meia hora que já fiz centenas de vezes.
“Meus ataques de pânico surgiram do nada e eram absolutamente apavorantes”
Principal reportagem: o recente ataque terrorista do dia 11. Parece que não consigo me afastar da notícia e das imagens chocantes; não tenho dormido bem. De repente, quando me aproximo de uma ponte, meu coração começa a bater depressa. Em seguida, minhas pernas amolecem. Você vai cair da ponte, avisa uma voz dentro da minha cabeça. Agora meus braços ficam dormentes. Você vai perder o controle e morrer. Fico apavorada. Minhas mãos agarram o volante com força; só quero passar pela ponte e sair da estrada. Faço isso, entro num estacionamento e começo a chorar. O que está acontecendo comigo?
Acontece que tenho transtorno do pânico, um tipo de ansiedade, e os ataques continuam, surgidos do nada, pelos 12 anos seguintes. No início, eu não sabia o que estava acontecendo; desde então, aprendi muito.
Ao contrário do medo, que é a reação a uma ameaça verdadeira, o pânico é um medo intenso na ausência de perigos reais. De acordo com um estudo publicado na Prescriber, revista para profissionais de saúde do Reino Unido, cerca de 7% dos europeus apresentam “síndrome do pânico”, enquanto 2% sofrem de “transtorno do pânico”, definido com mais restrições. O problema é mais comum entre os 45 e os 59 anos, embora geralmente o primeiro ataque aconteça entre os 20 e os 40 anos. (Segundo a Organização Mundial da Saúde, 9,3% dos brasileiros apresentam algum transtorno de ansiedade.)
As mulheres têm o dobro da probabilidade de apresentar transtorno do pânico. É improvável que a razão seja biológica, diz Martin Antony, escritor e professor de Psicologia da Universidade Ryerson, em Toronto. Ele explica que talvez os homens simplesmente não queiram admitir para os pesquisadores que sofrem de pânico.
Quem tem o problema costuma falar de estresses recentes, como casamentos ou divórcios, mudanças, perda de emprego ou emprego novo, problemas financeiros ou de saúde. Eilenna Denisoff, psicóloga clínica e diretora da CBT Associates, em Toronto, explica: “São estresses diferentes dos problemas cotidianos, como receber uma multa de estacionamento. Em épocas estressantes, dormir mal nos deixa mais sensíveis a eventos ligados à ansiedade, como a taquicardia. Os ataques de pânico ocorrem quando o cérebro identifica esse batimento cardíaco acelerado como sinal de perigo.
“Na verdade, não há perigo, mas o cérebro lê erradamente os sinais como necessidade de fugir”, explica Eilenna.
Os seres humanos são feitos para sobreviver. A reação de luta ou fuga nos permite correr mais depressa e pular mais alto quando somos perseguidos. Assim, em termos fisiológicos, a reação do cérebro ao ‘sinal de perigo’ da taquicardia é tirar sangue dos membros para proteger os órgãos centrais do corpo.” Isso explica a sensação de amolecimento dos membros. “Na verdade, a pessoa não corre perigo, mas o cérebro lê erradamente os sinais como necessidade de fugir.”
Para mim, o fator estressante era a mudança iminente. Além disso, eu não estava dormindo bem, e ouvir mais notícias sobre o 11 de Setembro provavelmente acelerou meu ritmo cardíaco.
O primeiro ataque costuma levar ao transtorno do pânico. Como nos fazem sentir que perderemos o controle e morreremos, os sintomas, quando tornam a ocorrer, provocam outro ataque de pânico, diz Eilenna. “O cérebro passa a procurar situações onde você teria medo ou se sentiria encurralado.” Em poucas palavras, começamos a temer o medo.
A princípio, tentei pegar a estrada uma semana depois – e, novamente, o pânico me levou à primeira saída. Em seguida, passei a só usar ruas menores e mais lentas. Semanas depois, mudei-me para as Bermudas, onde não tínhamos carro e não havia autoestradas. Enfim, fiquei muito aliviada. Não contei a meu marido sobre os dois episódios assustadores; sabia que ele amava minha força e independência e tive vergonha de ser tão fraca. Raciocinei que era apenas uma pequena falha e deixei de lado.
Para nos deslocar, tínhamos uma motoneta, na qual eu ia de carona, e pegava o ônibus para ir a algum lugar sozinha. Fiz muito isso nos primeiros meses, mas certo dia, quando peguei o ônibus para ir ao centro da cidade fazer compras de Natal, meu coração disparou. E, é claro, em seguida vieram o suor, as pernas bambas e a sensação de que eu perderia o controle ou “enlouqueceria”.
Não tinha chegado a meu destino, mas dei o sinal e, em lágrimas, voltei a pé para casa, onde me senti mais segura. Alguns dias depois, tentei pegar o ônibus outra vez… e a mesma coisa aconteceu. O que me forçara a evitar as autoestradas agora me forçava a evitar o transporte público.
Naquela noite, contei a meu marido o que estava acontecendo. Ele foi muito solidário; eu não deveria ter me calado, porque foi bom desabafar. Mas ele ficou tão desnorteado quanto eu. Procuramos na internet “medo de autoestradas” e “medo de transporte público”, e foi então que soubemos que muita gente passa por episódios chamados ataques de pânico.
Que alívio saber que eu não era a única! Mas meu coração se apertou quando soube que o que aconteceu no ônibus significava que eu também tinha agorafobia (medo de lugares públicos e de multidão), que geralmente acompanha o transtorno do pânico. Ficamos com medo de que, se surgirem sintomas de pânico, não conseguiremos escapar. Em casos extremos, o mundo encolhe tanto que temos medo de sair de casa.
Estava na hora de resolver isso; imagine se eu deixaria algo de minha cabeça controlar minha vida. Li que conversar sobre o problema com pessoas de quem gostamos ajuda. Assim, alguns dias depois, quando fiz uma visita a Toronto, jantei com minha melhor amiga e seu marido e lhes contei sobre os ataques de pânico. Lindsay virou-se para Todd com olhos arregalados, depois para mim e disse:
– Todd passou por isso há alguns anos!
– Aos 28 anos, tive ataques de pânico – confirmou ele timidamente.
Ele sofreu vários episódios em alguns meses. Contudo, tinha acabado de assumir a empresa da família e se sentia muito estressado. Certa noite, num restaurante com Lindsay, seu coração começou a bater depressa. Ele achou que estava sofrendo um infarto e sentiu necessidade de fugir. Eles foram embora no meio da refeição, e a taquicardia parou, mas na manhã seguinte Todd foi ao médico. “Acho que tive palpitações ontem à noite.” O médico o examinou e disse: “Parece que você teve um ataque de pânico.” Ele encaminhou Todd a um psiquiatra, que lhe receitou Ativan (um ansiolítico tomado quando começam os sintomas de pânico). Todd tomou o remédio e evitou restaurantes, mas teve um ataque de pânico quando estava no saguão de um aeroporto. A agorafobia se instalara.
Entretanto, ele resolveu o problema sozinho: aprendeu técnicas de relaxamento, como a respiração profunda, e conseguiu reduzir o Ativan. Finalmente, a frequência dos ataques diminuiu até desaparecer, e ele parou de tomar o remédio. De fato, Todd me disse: “O medicamento foi fundamental, e ler sobre os ataques de pânico e saber que não são raros ajudou bastante.” Ele me deu seu exemplar de Living With Fear: Understanding and Coping with Anxiety (Vivendo com medo: compreendendo e enfrentando a ansiedade), do Dr. Isaac M. Marks.
De volta às Bermudas, ousei pegar o ônibus outra vez, com o livro na bolsa como antídoto caso tivesse um ataque de pânico. Com alguns minutos de viagem, meu coração disparou; peguei o livro e o abri nas páginas marcadas, que diziam que o pânico não me mataria, que eu não “perderia o controle” nem “enlouqueceria”. Isso me acalmou.
Nos dois anos seguintes nas Bermudas, mantive o pânico sob controle dessa maneira; não pensei em terapia nem medicação. Mas era inevitável que, ao retornar à terra das autoestradas, eu precisasse de mais do que um livro para me pôr atrás do volante.
Logo depois de voltar para casa, evitei os ataques de pânico durante nove anos recorrendo a meu marido para dirigir em autoestradas. No entanto, só contei minha “fraqueza” aos mais íntimos. Sabia que a terapia era a única maneira de me livrar daquilo para sempre. Mas isso significaria enfrentar o medo – e eu estava assustada demais para pensar em voltar à estrada.
Então, compramos uma casinha no campo que precisava de consertos. Meu marido passaria semanas reformando-a enquanto eu trabalhava na cidade. Era uma viagem de três horas pela autoestrada; não havia ônibus, e, se eu quisesse visitá-lo nos fins de semana, precisaríamos de um segundo carro. Finalmente, estava na hora de procurar um psicólogo.
O transtorno do pânico pode ser tratado com antidepressivos a longo prazo e betabloqueadores para o alívio imediato dos sintomas. Mas os especialistas reconhecem que a terapia cognitivo-comportamental (TCC) é o melhor tratamento. Ela resolve a ansiedade mudando o comportamento e a cognição subjacentes que nos dizem que os sintomas são perigosos.
“Mudar a reação aos sintomas é fundamental”, diz Martin Antony. “Então, quando você se dispõe a deixar seus ataques de pânico acontecerem sem tentar controlá-los, costumam parar.”
A terapia de exposição tem papel importante. A meta é passar pelas mesmas sensações de um ataque de pânico e descobrir que não é preciso ter medo delas.
Na primeira sessão de terapia, aprendi a respiração profunda: inspirar longa e lentamente pelo nariz, expirar longa e lentamente pelos lábios. “Essa será sua ferramenta para se acalmar quando se sentir em pânico”, explicou a psicóloga.
Desse modo, uma semana depois, começamos a “terapia imagética”, uma forma de terapia de exposição. Isto é, ela me pediu que lhe dissesse as rotas da autoestrada perto de casa consideradas zonas proibidas. Depois me pediu que fechasse os olhos e imaginasse que estava dirigindo pelo caminho menos assustador, descrevesse cada passo e classificasse o nível de ansiedade de um a dez.
“Um”, eu disse, saindo mentalmente de casa, depois “dois”, quando entrei na próxima rua.
A ansiedade pulou para “oito” quando cheguei à rua que levava à autoestrada. Meu coração batia com força, eu começava a suar.
“Faça a respiração”, orientou ela.
A psicóloga me perguntou se eu levava alguma coisa na bolsa para o caso de não me sentir bem. Na verdade, eu tinha chiclete de hortelã para problemas digestivos.
“Ótimo”, disse ela. “Imagine que está mascando chiclete.”
Agora, o momento da verdade: em minha imaginação, acelerei e entrei no tráfego da autoestrada.
“Dez.”
Conforme minhas pernas ficaram bambas, tive aquela sensação horrível de que perderia o controle.
“Tudo bem, continue respirando”, aconselhou a terapeuta. “Falta menos de um quilômetro até a próxima saída.”
Momentos depois, vi na mente a saída e comecei a me acalmar quando cheguei lá e desacelerei. Meu alívio virou medo quando a terapeuta disse: “Seu dever de casa é fazer isso de verdade esta semana. Então, lembre-se da respiração e leve o chiclete. Ou seja, não vai ser muito diferente do que fazer na cabeça.”
Assim, na terça-feira, depois do jantar, respirei fundo e peguei as chaves. Exatamente como na terapia, meu coração bateu forte quando cheguei à autoestrada. Mas, usando as ferramentas novas, consegui chegar à saída sem que os sintomas físicos aumentassem. Fiquei radiante.
Posteriormente, em mais quatro sessões de terapia, fizemos a prática imagética, cada vez numa rota mais difícil ou aumentando a distância. O dever de casa combinava com o que tínhamos imaginado, e a cada semana eu conseguia na prática, embora sempre voltasse para casa pelas ruas comuns.
Finalmente, num dever de casa que envolvia a rota mais assustadora até então, saí da autoestrada sem pânico… e disse a mim mesma: “Ora bolas, vou tentar.” Fiz o retorno e voltei à autoestrada a caminho de casa. Foi um sentimento de vitória, e desde então não tive outro ataque de pânico.
Caso se identifique com os sintomas, não deixe de procurar ajuda médica.