Segundo pesquisa, o consumo de cigarro aumentou durante a pandemia de Covid-19. Conheça os riscos do tabagismo para os pacientes de coronavírus.
Amanda Santos | 31 de Maio de 2020 às 18:18
O consumo de cigarro no Brasil aumentou durante a pandemia do novo coronavírus. Um estudo da Fundação Oswaldo Cruz realizado em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade Estadual de Campinas aponta que 34,3% dos entrevistados que se declararam fumantes passaram a consumir mais cigarros por dia durante a pandemia — 22,8% aumentaram em dez, 6,4% em até cinco e 5,1% em 20 ou mais cigarros.
A pesquisa ouviu 44.062 brasileiros, de ambos os sexos, todos os níveis de escolaridade e todas das faixas etárias a partir de 18 anos, entre os dias 24 de abril e 8 de maio. Do total, 12% disseram ser fumantes.
A falta de perspectiva, as incertezas e o estresse gerados pela pandemia são alguns dos fatores apontados como responsáveis pelo aumento do consumo de cigarro. Além disso, a pesquisa também revelou que o vício é maior entre as mulheres (29,1% fumaram mais de dez cigarros ao dia, contra 17,3% dos homens) e os indivíduos com menor grau de escolaridade (24,6% aumentaram cerca de dez cigarros por dia, contra 22,6% entre os que possuem superior completo).
O tabagismo traz consequências graves aos fumantes, que integram o grupo de risco da Covid-19. Esta população é mais suscetível a desenvolver doenças cardíacas e pulmonares, que estão entre os principais fatores de risco associados à mortalidade pelo novo coronavírus.
Mais de 50 doenças crônicas são causadas pelo consumo do cigarro. Além disso, as principais comorbidades colocadas como fator de risco para Covid-19 são decorrentes do tabagismo. Uma delas é diretamente ligada: a DPOC (doença pulmonar obstrutiva crônica). “A DPOC é um fator de risco para um pior desfecho de Covid-19. O mesmo vale para quem tem asma e fuma”, alerta o pneumologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Dr. Elie Fiss.
Segundo boletim divulgado pela Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo neste sábado (30), dos 7.532 óbitos pela Covid-19, 5.871 (80,7%) apresentaram um ou mais fatores de risco associados à mortalidade. Destes, 3.886 (66,2%) sofriam de alguma doença do coração e/ou pulmão. Segundo José Rodrigues, pneumologista da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, uma doença pulmonar crônica que não esteja controlada aumenta o risco de adquirir Covid-19 e evoluir para a forma grave.
“O vírus tem o ciclo dele no pulmão, mas há dois grandes problemas: falta de medicação que consiga bloquear a replicação do vírus e a consequência do vírus trazendo um processo inflamatório que pode ser devastador. Se o vírus infectar um pulmão já inflamado, por conta do cigarro ou de doença, a probabilidade do óbito é maior”, explica Rodrigues.
De acordo com Rodrigues, um estudo inglês apontou que fumantes têm risco aumentado para complicações pulmonares em 45% comparando com ex ou não fumantes. O índice sobe para 88% se houver doença pulmonar estabelecida relacionada ao tabaco. Nesse caso, o risco de morte é alto.
“O paciente fumante tem o sistema de defesa da via aérea inferior prejudicado. Com as 4.500 substâncias tóxicas que a queima do tabaco acaba liberando na via aérea, a mucosa brônquica fica mais inflamada. Essa irritabilidade faz com que haja uma produção de muco e isso facilita a fixação dos agentes infecciosos respiratórios na superfície da via aérea. Um outro mecanismo que o cigarro acaba emitindo é a depuração dessa secreção. Existe uma produção maior de catarro. O processo inflamatório no pulmão dos fumantes favorece a fixação, proliferação e a invasão dos agentes infecciosos, no caso, a Covid-19”, ressalta Rodrigues.
Segundo dados do Inca (Instituto Nacional do Câncer), a dependência de nicotina mata 428 pessoas por dia no Brasil. Além disso, R$ 56,9 bilhões são perdidos a cada ano devido a despesas médicas e perda de produtividade e 156.216 mortes anuais poderiam ser evitadas. O órgão estima que até o final de 2020, no Brasil, surgirão 17.760 novos casos de câncer de pulmão, traqueia e brônquio em homens e 12.440 em mulheres.
De acordo com a psicoterapeuta Ana Beatriz Cintra, especialista no tratamento de depressão, ansiedade e síndrome do pânico, o cigarro é um mecanismo de fuga da ansiedade, atualmente causada pelos desdobramentos da pandemia e a expectativa criada pelas notícias que a cercam.
“Os fumantes relatam que o cigarro acalma. Mas isso é puramente psicológico porque a química do cigarro acelera o metabolismo e deveria ser ao contrário. É mais pelo ritual de fumar, porque ele se desconcentra de tudo o que está acontecendo e se concentra no ato de fumar. É isso que gera a tranquilidade que relatam”, afirma Cintra.
Para baixar a ansiedade, ela indica a prática de atividade física e o aproveitamento do tempo para trabalhar na elaboração de um projeto pessoal para o futuro.
PATRÍCIA PASQUINI/FOLHAPRESS