Descubra como a história de uma célula de gordura contada por ela mesma e o que fazer para ter uma alimentação equilbrada e saudável.
Redação | 18 de Julho de 2019 às 17:00
Já imaginou o que se passa durante um dia de vida de uma célula de gordura? Confira a seguir a história dela – contada por ela mesma:
São dez horas e o “Corpo” está sentado no seu cubículo dando uma olhada nos e-mails. Estou grudada ao fígado, dando uma olhada nos restos metabólicos do café da manhã: um bolinho com gotas de chocolate, comprado pronto e engolido com água vitaminada. O bolinho e eu somos velhos amigos (com suas colossais 400 calorias, poderia chamá-lo de meu vale-refeição), mas água vitaminada? Uau! Dizem que é uma bebida energética melhorada, um coquetel de nutrientes. Que nada! É só açúcar na garrafa, e eu adoro. Passa rápido pelo sistema digestório e cai no fígado, que me repassa diretamente a frutose na forma de gordura. Que maravilha!
Depois de milênios na corda bamba, cedendo nossas reservas sempre que os músculos e nervos precisavam, estamos tomando o poder. Não acredita? No Brasil, 48% da população está acima do peso e 15% dos brasileiros, obesos. Doença cardiovascular? Diabete tipo 2? Câncer? Não é problema meu. Estou aproveitando.
O Corpo ficou com fome de novo às 11 horas. Não olhem para mim! O café da manhã deveria ter fornecido calorias suficientes. Não é culpa minha. Veja bem, minha tarefa é armazenar gordura e depois mandar ao cérebro um hormônio chamado “leptina”, avisando que é hora de cortar o apetite do Corpo. E é o que faço. O sistema costumava funcionar feito relógio. Mas hoje em dia produzo leptina e o cérebro não entende, muitas vezes está ocupado com o smartphone ou com pressa.
Mas quem sou eu para me queixar? A vida é doce – de sacarina, na ver- dade. Mas nem sempre foi assim. Eu me lembro de 40 anos atrás, quando nasci com algumas amigas adiposas (“puberdade”, é como dizem os médicos). Na hora da refeição, eu implorava alguns ácidos graxos a mais para transformar em gordura e armazenar. Naquela época, o Corpo era ativo e gastava muito do que ingeria. Nós inchávamos um pouquinho e encolhíamos de novo.
Mas sei ser paciente. Afinal de contas, não vou a lugar nenhum. Literalmente. Quando o Corpo emagrece, nós encolhemos mas não sumimos; quando ele engorda, nos enchemos de gordura e nos expandimos. Assim, o Corpo pode me privar e vou encolher, mas é só voltar aos hábitos inadequados que cresço de novo.
No fim dos anos 80, quando foi para a universidade, o Corpo se viciou em refrigerante. No almoço, quase sempre bebia um.
A princípio foi bom – uma guloseima especial –, e toda vez eu recebia do fígado algumas gotas de gordura e as armazenava. Ele também gostava da cafeína e da animação que isso lhe dava na parte da tarde. Assim que arranjou emprego, o Corpo precisou de outra lata para vencer o soninho da tarde. Esse foi o começo dos meus anos de glória.
Ei, escutem só! Ele está abrindo uma lata agora mesmo, enquanto come a sua lasanha de micro-ondas com teor de gordura reduzido. Está tentando perder alguns quilos… E, se alguém quer emagrecer, faz sentido reduzir a gordura. Bom senso, não é? Mas já experimentou lasanha sem gordura vegetal ou animal? Tem gosto de papelão. Por isso, as indústrias põem um monte de sal e mais um pouco de açúcar. Para mim ainda é fácil obter um restinho de gordura e guardá-lo.
Na universidade, quando o Corpo jogava futebol ou pedalava e preparava as refeições em casa, sua comida tinha muito menos açúcar e o cérebro atendia aos meus avisos de leptina. Depois de um bom fim de semana com frango frito e cerveja eu inflava um tiquinho. Aí, no dia seguinte, ele comia um pãozinho e uma maçã pela manhã e caminhava até a sala de aula. Pronto, os músculos queimavam todo o açúcar e eu era forçada a decompor parte da minha preciosa gordura em ácidos graxos e glicerol. Entregava o glicerol ao fígado, que o reestruturava em glicose, e os ácidos graxos livres iam direto para as mitocôndrias dos músculos, para produzir energia. Eu desinchava um pouco e ficava quietinha.
Agora, ele engole a lasanha em seis garfadas e volta para o computador. Quando se levanta da cadeira para ir até o estacionamento, é o máximo que o coração trabalha o dia inteiro. Mas não me preocupo; há muito glicogênio nas células musculares para oferecer aquela energia rápida que faz os músculos funcionarem. Fico aqui quietinha e confiante de que nunca vão me chamar para liquidar o meu estoque e transformá-lo em energia.
O que receberei esta noite? Frango frito? Costeleta? Hambúrguer? Quando finalmente chega a hora de jantar, o Corpo prepara um prato de frango e salada. Espinafre, tomate, pimentão e… ei, que diabos é isso?! Suco de uva integral? Azeite de oliva e vinagre para temperar, nem mesmo um molhinho cremoso? Nessa salada há fibras que vão retardar a digestão do pão que ele pega na cesta para acompanhar.
“O que houve?” eu me pergunto.
– Vamos reduzir as comidas processadas – diz ele para a mulher. – Comer mais comida de verdade.
Para mim isso é ruim, muito ruim. Depois do jantar, ele leva o cachorro para passear antes de assistir ao jogo na poltrona. E, antes de dormir, prepara uma deliciosa e nutritiva refeição caseira para o almoço do dia seguinte. Estou preocupada!