Aditivos escondidos em rótulos de alimentos ultraprocessados podem ser nocivos para a saúde; saber reconhecê-los é fundamental.
Redação | 2 de Agosto de 2022 às 15:30
“Você se incomoda de ter de comer pizza pronta outra vez?”, perguntei a meu filho enquanto me preparava para sair. Que adolescente de 16 anos não adora pizza? “Veja se come uma salada também”, instruí, ansiosa por garantir que ele tivesse uma refeição saudável. Mas, ao dar uma olhada nos ingredientes listados na caixa, comecei a ter minhas dúvidas.
Além do elevado teor de sal, gordura saturada e açúcar naquela pizza de pepperoni de aparência inocente, também havia ingredientes misteriosos, como xarope de glucose, dextrose, extrato de levedura e nitrito de sódio. O que eu estava dando a meu filho nas noites em que saía com amigos? Prometi a mim mesma que descobriria.
Hoje, um em cada dois brasileiros está acima do peso. Viver com quilos a mais pode provocar uma série de problemas de saúde que ameaçam a vida, como diabetes, cardiopatia e câncer. Esse é um problema mundial. E uma das razões para estarmos acima do peso é comermos cada vez mais alimentos práticos e ultraprocessados, que contêm aditivos e outros ingredientes obscuros.
Na Europa, é exigido que os fabricantes listem todos os ingredientes contidos nos produtos industrializados para ajudar os consumidores a fazer escolhas saudáveis. Mas, apesar disso, estudos indicam que os europeus compram cada vez mais alimentos industrializados com ingredientes nocivos.
No Reino Unido, mais da metade da alimentação consiste em produtos ultraprocessados, como refeições prontas, pão industrializado, doces, cereais açucarados e bebidas adoçadas. A Alemanha vem logo atrás, com cerca de 46% da alimentação compostos desses produtos. E a lista continua: a população de seis países europeus – Bélgica, Finlândia, Áustria, Irlanda, Letônia e Noruega – com seus mais de 30%.
Comece jovem e poderá morrer jovem. Em um estudo espanhol de 2019, quase vinte mil universitários formados foram acompanhados por mais de 14 anos. Com média inicial de 37,6 anos, 335 pessoas morreram. O câncer foi a principal causa. Dessa forma, os pesquisadores constataram que os participantes que comiam mais alimentos ultraprocessados tinham mais chance de morrer durante o estudo. A probabilidade era de que aqueles que comiam mais de quatro porções por dia tinham um risco 62% maior. Também tinham uma expectativa de IMC (índice de massa corporal) mais alto – mais peso em relação à altura – do que os que comeram menos industrializados.
Ao pesquisar mais, eu me surpreendi com alguns acréscimos à nossa alimentação cotidiana altamente refinada e o efeito que causam à saúde. Eis alguns alimentos industrializados muito consumidos (e seus ingredientes) que, para todos nós, seria bom limitar.
Acrescentar qualquer tipo de açúcar, seja branco ou mascavo, mel, xarope de milho, sacarose ou mesmo suco de fruta concentrado aos alimentos faz com que fiquemos tentados a comer mais. Isso pode nos fazer engordar. Na verdade, não existe açúcar adicionado que seja saudável.
A adição de açúcar está por toda parte: na comida para bebês, no catchup, nos molhos para macarrão, nas refeições prontas e nas batatas fritas, só para citar alguns.
Está presente até em algumas granolas, exaltadas como saudáveis no café da manhã. “Tente trocar por flocos integrais, ricos em fibras, ou mingau feito com leite desnatado ou semidesnatado”, recomenda Simon Steenson, Ph.D. e cientista da nutrição da British Nutrition Foundation. “Jogue por cima uma banana fatiada ou um punhado de frutinhas vermelhas e terá uma das cinco porções de frutas e hortaliças recomendadas por dia.”
De acordo com um grande estudo americano feito em 2014, a probabilidade de morrer de doença cardíaca pode triplicar quando o açúcar adicionado representa 25% ou mais da alimentação. Isso em comparação a quem mantém a ingestão de açúcar abaixo de 10%.
Os refrigerantes são uma das principais fontes de açúcar na alimentação. Um estudo de 2019 realizado pela União Europeia com mais de 450 mil pessoas de dez países revelou que um dado alarmante. Quem toma mais de um refrigerante açucarado por dia tem probabilidade 59% mais alta de morrer de doenças digestivas, se comparado a quem consome menos de um por mês. Algumas dessas doenças envolvem problemas hepáticos, pancreáticos e intestinais.
O rótulo do produto pode dizer apenas “açúcar”. No entanto, quanto mais perto do início da lista de ingredientes, mais açúcar conterá. Se o item acrescentado terminar em “ose” – como sacarose, glicose, maltose, frutose –, também é açúcar. Melado, xarope de agave e amido hidrolisado também são açúcares.
É facílimo encontrar refrigerantes com adoçantes artificiais. Você pode ver as palavras “diet”, “sem açúcar”, “zero açúcar” ou “baixas calorias”. Procure na lista de ingredientes aspartame (E951), acessulfame K (E950), sacarina (E954), sucralose (E955) ou uma combinação deles.
Não pense que, só por não ter açúcar natural adicionado, o produto vá lhe fazer bem. No ano passado, três estudos encontraram um vínculo entre o consumo de refrigerantes adoçados artificialmente e a morte prematura por todas as causas. “Comparados com quem consome pouco esses refrigerantes (menos de um copo por mês), os que tomam dois ou mais copos por dia tiveram risco 52% maior de morrer de AVC, infarto e outros problemas cardiovasculares”, explica a Ph.D. Amy Mullee, do Centro Nacional de Vigilância Nutricional, de Dublin, na Irlanda, e coautora do estudo sobre refrigerantes mencionado na página anterior.
Refrigerantes diet, limonada, água tônica, bebidas esportivas, xaropes e sucos diluídos, sucos de fruta adoçados: qualquer bebida que contenha adoçantes artificiais, seja com ou sem gás, exige atenção.
Todos os especialistas dizem a mesma coisa: beba água. Parece sem graça? Acrescente uma fatia de limão, menta ou pepino à água mineral com ou sem gás.
Quando se frita bacon, o cheiro é uma delícia, mas a refeição que está sendo preparada não é saudável. Nitratos e nitritos são usados legalmente para conservar carnes processadas como bacon (assim como toucinhoou pancetta), presunto, salsichas, linguiças, salames – e, sim, até o pepperoni da pizza de meu filho. Também são usados em alguns queijos. Mas os nitratos e nitritos formam compostos cancerígenos chamados nitrosaminas. Comê-los traz o risco de câncer de mama e de intestino.
A Organização Mundial da Saúde classificou as carnes processadas como carcinogênicas, ao lado do tabaco. Um estudo britânico recente verificou que o risco de câncer colorretal aumentava 20% com o equivalente a cada fatia de presunto ou tira de bacon que a pessoa comesse por dia. E um estudo de 2018 da Universidade de Glasgow, na Escócia, com mais de 262 mil mulheres, revelou que quanto mais carne processada as mulheres pós-menopausa consumiam, maior a probabilidade de terem câncer de mama. Para as que comiam mais de 9 gramas por dia (cerca de meia fatia de presunto), o aumento da probabilidade foi de 21%.
“Geralmente, as carnes processadas são riquíssimas em sal e gordura saturada”, diz Nina McGrath, Ph.D. e especialista em segurança de alimentos do European Food Information Council (Conselho Europeu de Informação Alimentar, EUFIC), em Bruxelas.
“Que tal transformar seu sanduíche de bacon numa guloseima ocasional?”, sugere Simon Steenson. Ele também recomenda aparar o excesso de gordura ou comprar cortes mais magros.
Fatias de queijo industrializado, alguns requeijões cremosos e muitos outros alimentos industrializados contêm fosfato, aditivo que, em grande quantidade, prejudica os rins e o coração e enfraquece os ossos.
Todos precisamos de fósforo para ter dentes e ossos saudáveis e manter o funcionamento do organismo. Ele ocorre naturalmente em alimentos ricos em proteínas, como carne, aves, nozes e feijões. Mas até 30% do fósforo que consumimos vem de alimentos com fosfato adicionado, como bolos, biscoitos, carnes processadas, peixe enlatado, iscas de peixe prontas, purê de batata instantâneo, refrigerantes, comida para bebês… a lista é grande.
O perigo é ingerir demais sem perceber.
Além disso, os fosfatos adicionados são mais prejudiciais do que os encontrados naturalmente nos alimentos, de acordo com um estudo americano de 2015 feito pelo Houston Methodist Hospital. Nele, mostrou-se que laticínios e cereais com fosfato adicionado causaram picos maiores do nível de fosfato no sangue. Sabe-se que o teor elevado de fosfato enrijece os vasos sanguíneos, eleva a pressão arterial e tem o potencial de provocar insuficiência renal.
A Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar, agência independente da União Europeia, recomenda uma ingestão diária aceitável de 2,8 g de fósforo de qualquer fonte para um adulto de 70 kg.
Duas fatias de queijo industrializado contêm 385 mg de fosfato, contra os 85 mg em 50 g de queijo cottage.
“A forma mais eficiente de garantir que a exposição dos consumidores ao fosfato fique dentro de limites seguros é reduzir seu uso como aditivo alimentar”, alerta Camille Perrin, diretora de política alimentar da Organização Europeia de Consumidores, sediada em Bruxelas. “A Comissão Europeia deveria rever o nível de uso autorizado.”
Por enquanto, procure no rótulo ácido fosfórico ou difosfato, trifosfato e polifosfato – ou os números E338 a 341, E343, E450 a 452.
É extremamente provável que seu prato fumegante de sopa enlatada contenha um ingrediente que (no mínimo) provoca dor de cabeça e aumenta, de forma mais grave, a pressão arterial e o nível de insulina – fator de risco do diabetes tipo 2 – se você o ingerir em grande quantidade.
É comum adicionar o ácido glutâmico (um aminoácido) ou algum de seus sais, como o glutamato monossódico (MSG), a alimentos ultraprocessados para realçar seu sabor. O glutamato é um aditivo artificial, mas os fabricantes também podem acrescentar extrato de levedura ou de soja para obter o mesmo resultado. Você encontra esses ingredientes em pão industrializado, alguns molhos, produtos de carne processada, macarrão instantâneo, temperos e condimentos como molho de soja e caldo em cubos – e até em bolos.
Um estudo de 2018 feito por pesquisadores italianos e holandeses acusou o glutamato monossódico de ser responsável por vários outros problemas de saúde, como mudanças no cérebro que afetam o comportamento, promoção da obesidade, lesões do fígado e problemas reprodutivos. O estudo chegou ao ponto de dizer que a proibição total do glutamato como realçador de sabor deveria ser considerada. Em 2017, a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar recomendou que a União Europeia baixasse o generoso limite atual da quantidade de glutamato que pode ser adicionada aos alimentos.
Procure no rótulo ácido glutâmico, glutamato monossódico, dissódico ou outros glutamatos ou os números E620 a 625. “A questão é evitar os produtos com isso no rótulo”, diz Nina McGrath.
Proteína hidrolisada, levedura autolisada e caseinato de sódio são outros ingredientes que podem conter ácido glutâmico e que deveriam inspirar cuidados. Procure também extrato de levedura ou de soja.
Portanto, talvez seja bom pensar duas vezes se você toma muitas dessas saborosas sopas prontas. Ou, como sugere Simon Steenson, faça sua própria sopa. “Tente usar o máximo possível de legumes e acrescente uma lata de feijão para aumentar o conteúdo de fibras e torná-la mais substancial.”
O resultado disso tudo é que comer alimentos ultraprocessados em excesso faz mal à saúde. Agora leio os rótulos com atenção e estou ficando rápida em perceber as coisas desagradáveis escondidas neles.
Como dizem os especialistas, não é difícil fazer uma alimentação saudável e manter alimentos e aditivos insalubres em nível mínimo; basta investir um pouquinho de tempo e informação.