Fatores sociais dificultam a identificação de comportamentos que sugiram o diagnóstico.
O mês de abril marca o período em que acontece a campanha de conscientização sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Assim, o Abril Azul foi definido pela Organização das Nações Unidas (ONU) para informar sobre o transtorno, chamar atenção para os indicativos de um possível diagnóstico e também desmistificar esse tema que ainda é alvo de preconceitos e esteriótipos.
A desinformação sobre o autismo tem uma série de consequências negativas, como a falta de inclusão em locais que deveriam ser comuns e julgamentos. Contudo, um problema que não pode ser negligenciado é o diagnóstico tardio em mulheres.
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Primeiramente, o TEA acontece devido a uma alteração das funções no desenvolvimento neurológico de uma pessoa. Logo, interfere na capacidade de comunicação, linguagem, interação social e comportamentos, podendo variar em níveis, classificados em 3 graus de suporte.
A pessoa com autismo leve tem algumas dificuldades, mas não demanda muita ajuda. No nível moderado, é necessário apoio substancial, e o severo, em que a pessoa precisa de bastante suporte.
Normalmente, a dificuldade em se relacionar com os outros, de iniciar ou manter uma conversa, de compreender ironias e metáforas, e baixa tolerância a barulhos e ambientes agitados são alguns dos indicativos do diagnóstico. No entanto, muitas vezes os sintomas passam despercebidos no caso de mulheres.
"Alguns comportamentos ligados ao transtorno são mais socialmente aceitáveis quando partem do sexo feminino, como por exemplo, os interesses mais restritos ou uma certa timidez, o que ajuda a camuflar alguns sintomas. Por isso, pais, famílias e escolas devem estar mais atentos às meninas", explica a neurologista Dra Ana Paula Gomes.
Além disso, a neuropsicóloga especialista em autismo Marina Almeida falou ao Portal Dráuzio Varella que o marcador do neurodesenvolvimento começa na puberdade, enquanto, nos meninos, se inicia já na infância. Ela destacou também que, históricamente, os métodos de diagnóstico eram feitos focados nos homens, sendo mais obstáculos para a identificação do transtorno em mulheres.
Outra questão trazida na publicação do portal é que as mulheres costumam apresentar uma maior percepção social, o que as permite observar e imitar certos comportamentos.
"As meninas fazem uma hiperadaptação social, que se torna uma camuflagem, o que vai dificultando o diagnóstico. Mas isso gera um grande sofrimento, porque elas nunca foram reconhecidas", complementou Marina.
Diagnóstico tardio tem uma série de efeitos negativos
A identificação do TEA nos primeiros anos de vida, em torno de 2 ou 3 anos, permite que a criança receba apoio desde cedo. Assim, com a ajuda de uma equipe multidisciplinar a pessoa consegue ter um bom desenvolvimento e melhorar suas habilidades sociais, o que é impactado com o diagnóstico tardio.
Logo, o diagnóstico tardio tem um impacto significativo na saúde mental das mulheres. Consequentemente, aumenta risco de agravamento de quadros de ansiedade, depressão, distúrbios alimentares ou de autoimagem.
"Não saber o que pode estar acontecendo, enquanto relações pessoas e profissionais podem estar em risco em função de comportamentos considerados fora do normal, impacta o dia a dia dessas mulheres", completa a Dra Ana Paula Gomes.
A atriz Bella Ramsey contou que o diagnóstico foi libertador
Bella Ramsey, conhecida por dar vida à Ellie na série 'The Last Of Us' falou em entrevista à Vogue Britânica sobre ter descoberto o diagnóstico de autismo em março deste ano.
"Foi como acender a luz de um quarto onde eu vinha tropeçando no escuro há anos. Finalmente, tudo se encaixou. Sempre me senti diferente. Tinha uma sensibilidade que as pessoas não entendiam, preferia rotinas previsíveis e me sentia exausta após interações sociais. Achei que era apenas parte da minha personalidade, mas o diagnóstico me mostrou que há uma razão para tudo isso."
O caso de Bella não é isolado. De acordo com o Mapa Autismo Brasil, um terço das mulheres recebe o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA) após os 20 anos de idade. A mesma pesquisa, conduzida totalmente online pela Universidade de Brasília (UnB), indica que o diagnóstico tardio acontece com apenas 9% dos homens. Já o diagnóstico precoce, entre os 0 e 4 anos, ocorre em 61,6% entre os homens, e apenas em 37,2% das mulheres.
Diante desse cenário, é evidente que há uma diferença notável nos diagnósticos para homens e mulheres, e que esse é um assunto que precisa de mais atenção. Apenas levando informações às pessoas será possível melhorar a qualidade de vida de tantas mulheres por aí.