O câncer de bexiga atinge milhões de pessoas ao redor do mundo anualmente. Saiba como fazer para detectar esta doença precocemente.
No mundo inteiro, cerca de 550 mil pessoas receberam diagnóstico de câncer de bexiga em 2018. No Brasil, a estimativa é que, de 2010 a 2022, haja 10.640 novos casos por ano. Muitos cânceres de bexiga são tratáveis, como o de Frances. O segredo é o diagnóstico precoce, e é aí que a situação fica complicada.
Ao contrário dos cânceres de próstata e mama, não há exame capaz de indicar o risco elevado de câncer de bexiga, e os próprios pacientes precisam perceber os sintomas preocupantes.
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A história de Frances Dobrowolski
Em agosto de 2019, quando notou sangue na urina, Frances Dobrowolski não se preocupou muito. Mas aí aconteceu de novo e, na consulta com o clínico geral marcada para dali a 15 dias, ela mencionou o estranho fato. O médico a encaminhou imediatamente a um urologista, e isso salvou a vida da avó aposentada de 78 anos de New Hampshire, nos Estados Unidos.
A urologista inseriu na uretra e na bexiga da paciente um tubo com uma minúscula câmera de vídeo (fez uma cistoscopia) e de cara viu os tumores cancerosos. Frances, que pôde assistir ao procedimento por uma tela, também viu os tumores, que nasciam nas paredes internas e cresciam para o interior da bexiga. “Era muito câncer”, diz ela.
Frances também descobriu que a causa pode ter sido o hábito de fumar. “Faz 13 anos que parei, mas
fumei dois maços por dia durante 40 anos”, conta ela. “Achei que, se tivesse alguma coisa, seria câncer de
pulmão, mas foi de bexiga.”
Dali a poucos dias, Frances fez uma cirurgia para remover os tumores. Como no exame de acompanhamento realizado semanas depois apareceu mais câncer na tela, ela se submeteu a uma segunda cirurgia. Também começou um regime de infusão de quimioterápicos na bexiga uma vez por semana durante seis semanas para matar as células tumorais remanescentes.
Quando o checkup seguinte revelou outro tumor, ela recebeu mais infusões. “No entanto, como procurei o médico assim que percebi os sintomas”, observa ela, “e como os tumores não estão chegando aos músculos, meu prognóstico é bom. Estou otimista.”
Sintomas do câncer de bexiga
O sintoma mais revelador de câncer de bexiga é o surgimento súbito de sangue na urina, a chamada hematúria, como no caso de Frances. Assim que vir o sintoma, comunique ao médico imediatamente; não espere que ele desapareça. A hematúria pode não ser acompanhada de dor; alguns pacientes esperam que suma sozinha e perdem um tempo precioso.
Além do sangue na urina, pode haver alterações do ato de urinar, como ardência, dor e aumento da frequência e da urgência. Esses sintomas podem ser enganosos, porque muita gente os atribui à idade ou à bexiga hiperativa e os ignora. Quando por fim revelam a preocupação, às vezes o médico confunde o problema com infecções do trato urinário.
Fatores de risco, idade e sexo
O hábito de fumar é o fator de risco mais importante do câncer de bexiga, de acordo com as pesquisas. Quando
inaladas, as toxinas da fumaça passam pelo pulmão, chegam à corrente sanguínea e são filtradas pelo rim, misturando-se à urina. Essa urina cheia de toxinas pode ficar horas na bexiga, envenenando suas paredes.
“Quando os pacientes param de fumar”, explica o Dr. Antoine G. van der Heijden, urologista do Centro Médico Universitário Radboud, em Nijmegen, nos Países Baixos, “a probabilidade de o câncer voltar ou evoluir diminui, e a sobrevida aumenta.
Os homens têm mais câncer de bexiga do que as mulheres. De acordo com estatísticas de 2015, o número total de casos novos na União Europeia incluía 103 mil homens e 28 mil mulheres; os médicos acham que é porque há mais fumantes entre os homens.
No entanto, embora o câncer de bexiga afete menos mulheres, a probabilidade de sobrevida delas é um pouco mais baixa do que a dos homens, e isso pode ter várias razões, segundo os especialistas. A doença pode avançar mais depressa nas mulheres porque a parede da bexiga é mais fina e permite que alguns tumores se espalhem com mais facilidade e invadam outros órgãos.
Hormônios como o estrogênio também podem ter um papel. E, como as mulheres são mais suscetíveis a infecções do trato urinário, é comum os médicos interpretarem os sintomas erradamente. A maioria das mulheres com câncer cujo primeiro sintoma foi sangue na urina recebe, a princípio, o diagnóstico de infecção urinária, explica a Dra. Renate Pichler, urologista da Universidade Médica de Innsbruck.
Ela diz que, se você tomou antibióticos e a infecção não diminuiu, isso não é normal. Está na hora de procurar um urologista e fazer um exame de câncer de bexiga.
A idade não tem muita importância nesse tipo de câncer, mas a idade média do diagnóstico é de 73 anos. “A maior incidência é na faixa etária de 70 a 75 anos”, informa o Dr. Heijden.
Tipos de câncer de bexiga
Há diferenças importantes entre os tipos de câncer de bexiga. Cerca de 75% dos pacientes (como Frances Dobrowolski) desenvolvem carcinomas uroteliais menos agressivos, que começam nas células do urotélio, o revestimento interno da bexiga. Em sua maioria, esses tumores são projeções finas, semelhantes a dedos, que brotam da superfície interna da bexiga rumo ao centro, e não por dentro das paredes e para fora da bexiga a fim de atingir os tecidos circundantes.
O Dr. Heijden acrescenta que alguns tipos de carcinoma urotelial podem ser mais agressivos, e os médicos os diferenciam em graus que vão de zero a quatro, com o número mais alto sendo mais invasivo. Os restantes 25% dos
pacientes têm cânceres mais agressivos. O carcinoma in situ começa como tumor não invasivo, mas tende a crescer e se espalhar mais depressa e tem probabilidade mais alta de recorrência.
Quase metade dos pacientes com esse tipo acaba desenvolvendo um tumor que invade os músculos, como afirma o Dr. Heijden. Alguns tipos raros de câncer de bexiga podem invadir os músculos desde o começo. São muito agressivos, mas cada um constitui apenas 1% do total de casos. O prognóstico e o tratamento dos pacientes dependem do tipo e do estágio do tumor.
Diagnóstico e Tratamento
Como Frances descobriu, para diagnosticar o câncer os urologistas fazem uma cistoscopia. Nela, o médico vê na tela do computador o revestimento interno da bexiga e tira uma amostra para a biópsia. Alguns médicos também pedem uma cistoscopia por fluorescência, que usa uma substância ativada pela luz azul com a finalidade de encontrar células anormais.
Além disso, o médico pode solicitar uma tomografia ou ressonância com contraste para destacar os tumores e determinar o tipo e o estágio exatos do câncer existente. Os cânceres que não invadem os músculos, como no caso de Frances, são removidos num procedimento chamado de ressecção transuretral do tumor da bexiga.
Um instrumento fino é inserido pela uretra até a bexiga. Para remover o tumor, há uma alça de arame na ponta da ferramenta. Em seguida, usa-se um eletrodo ou laser para destruir as células anormais remanescentes, que talvez não façam parte do tumor.
Depois da cirurgia, os médicos podem usar um cateter para injetar um medicamento líquido diretamente na bexiga e matar as células cancerosas que restarem. Esse tipo de tratamento se chama terapia intravesical. Os cânceres mais agressivos talvez exijam várias aplicações, ministradas durante meses e até anos, com o regime exato projetado para o caso específico do paciente.
Os pacientes também fazem cistoscopias regulares depois da cirurgia para ver se o câncer não retornou, porque os carcinomas uroteliais tendem a crescer de novo. Mas, com um bom monitoramento, é possível impedir que novos cânceres se instalem. Piet van Klaveren* pode confirmar. Sua luta com o câncer de bexiga começou em 1996. O diagnóstico se deveu ao sangue na urina, que a princípio ele ignorou.
“Como a maioria dos homens, adiei na esperança de que passasse sozinho”, recorda o farmacêutico de 73 anos de Wageningen, nos Países Baixos. Meses depois, quando finalmente falou com o médico, ele foi logo encaminhado a um urologista, que diagnosticou o carcinoma urotelial não musculoinvasivo – e o prognóstico era bom. Piet fez a cirurgia, poré um ano depois o câncer voltou.
Dessa vez, após removê-lo, o médico de Piet usou a terapia intravesical e, durante um ano, injetou quimioterápicos na bexiga. Piet ficou uma década sem câncer, até que, em 2011, mais uma vez identificou sangue na urina. E novamente fez uma cirurgia seguida por quatro anos de terapia intravesical.
“Atualmente, estou sem câncer”, afirma ele, observando que a vigilância regular é o segredo para permanecer assim. “Faço duas cistoscopias por ano.” A Dra. Pichler diz que os pacientes com câncer não musculoinvasivo em estágio inicial também podem receber imunoterapia por via intravesical a fim de estimular o sistema imunológico a atacar o câncer.
No caso dos cânceres musculoinvasivos e dos tumores que não podem ser eliminados por esses meios, é possível que os médicos recomendem uma cistectomia radical, ou seja, a remoção completa da bexiga. Depois, constrói-se um duto que leve a urina dos rins até uma pequena bolsa usada junto ao corpo, que o paciente esvazia manualmente, ou reconstrói-se a bexiga com um pedaço do intestino delgado da pessoa. “Os clínicos precisam escolher a opção certa para o paciente certo”, adverte a Dra. Pichler.
O segredo para se manter saudável depois do tratamento são os checkups e as cistoscopias regulares, dizem os especialistas. A Dra. Pichler explica que, em geral, os urologistas fazem esses exames de três em três meses nos dois primeiros anos, de seis em seis meses nos três anos seguintes e, depois, passam a ser feitos uma vez por ano.
Quem avista sangue na urina pela primeira vez ou tem infecções urinárias súbitas e recorrentes – ainda mais se nunca as teve – possui bons motivos para um exame urológico completo, afirma o Dr. Heijden. Mesmo que haja uma infecção urinária, isso não elimina inteiramente a possibilidade do tumor, porque os dois podem ser concomitantes.
Guarde bem este conselho do Dr. Heijden: “Em mulheres que, de repente, têm infecções urinárias recorrentes, a análise do urologista é obrigatória. Nos homens, uma única infecção urinária já é razão para ser encaminhado ao urologista.”