No Dia Nacional de Combate ao Alcoolismo, entenda como a bebida pode impactar a vida de quem a consome em excesso.
Tande Coelho, de 43 anos, vai ao bar com os amigos para consumir bebidas alcoólicas e ouvir música. Na maioria das vezes, ele gosta de tomar cerveja. Porém, de quando em quando, varia no consumo de álcool: troca a gelada pelo vinho tinto.
“Não bebo todo dia, mas, em média, de duas a três vezes por semana. Eventualmente, bebo sozinho em casa ou no bar perto de casa, mas isso é raro. A quantidade varia, mas diminuiu com a idade. Quando era mais jovem, bebia mais de 15 chopes em uma noite. Hoje, costumo tomar entre oito e dez long necks”, conta ele.
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As chamadas long necks são as garrafas de 355 ml. Como meio litro de cerveja com 4% de graduação alcoólica contém 16 g de álcool puro, Tande e os amigos ingerem de 90 a 113 g de álcool cada vez que saem. No entanto, o Ministério da Saúde recomenda consumo zero tanto para homens quanto para mulheres.
As autoridades de saúde pública brasileiras estão cada vez mais atentas aos hábitos alcoólicos e ao consumo abusivo da bebida. Segundo o Relatório Global sobre Álcool e Saúde, um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) feito em 2014, o álcool é consumido praticamente em todo o planeta.
(Imagem: nixki/iStock)
O álcool é o fator causal de mais de duzentas doenças e lesões
“Aqui, temos uma situação de contraste. Enquanto 51% da população não consome álcool, 25% bebem mais de 80% das bebidas alcoólicas. De um lado, altas taxas de abstinência. Do outro, elevado consumo de uma parcela significativa da população”. A análise é do psiquiatra Ronaldo Laranjeira, diretor da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas (UNIAD).
A OMS pinta um quadro assustador dos efeitos do álcool sobre a saúde humana. No mundo inteiro, 3,3 milhões de mortes anuais resultam da bebida. Ou seja, quase 6% de todas as mortes são atribuídas total ou parcialmente ao álcool.
No Brasil, o álcool esteve associado a 63% e 60% dos índices de cirrose hepática e a 18% e 5% dos acidentes de trânsito entre homens e mulheres, respectivamente, em 2012. Além disso, seu uso é fator causal de mais de duzentos tipos de doenças e lesões. De acordo com a OMS, também há uma relação entre o uso prejudicial de álcool e transtornos mentais e comportamentais.
Motivadas pelo desejo de melhorar a saúde e a segurança, as autoridades de mais de quarenta países criaram diretrizes nacionais para o consumo de bebidas. Mas, embora concordem que beber “demais” faz mal, parece que é difícil um consenso sobre o que é “demais”.
(Imagem: itakdalee/iStock)
O Dr. Laranjeira explica que, apesar da falta de concordância sobre o nível seguro, há, sim, alguns consensos. Por exemplo: “grávidas e adolescentes não deveriam consumir álcool porque não existe dose segura para esses grupos”. Outro: “mulheres e idosos são biologicamente mais sensíveis às bebidas por terem menos massa muscular.”
“Em geral, um copo de vinho ou de cerveja, no máximo, seria a dose segura. O fato de alguns países estabelecerem um limite maior tem mais a ver com lobby da indústria do álcool do que com evidência de pesquisa científica”, afirma ele.
Embora meio litro de cerveja a 4% contenha 16 g de álcool puro, meio litro de cerveja lager com 5% contém 20 g. E há diferença entre o consumo médio diário e uma bebedeira.
“Dessas duas modalidades, a mais prejudicial para o fígado é a que consome quantidades razoáveis todos os dias. Embora ambas provoquem malefícios, a de longo prazo é a pior”, alerta o Dr. Jorge Jaber, presidente da Associação Brasileira de Alcoolismo e Drogas (ABRAD).
Qual é a dose segura?
Apesar de estudos afirmarem que uma taça de vinho pode fazer bem, a maioria dos especialistas concorda que o teor de álcool mais seguro é zero.
Como enfatiza Fátima Marinho, diretora do Departamento de Doenças e Agravos Não-Transmissíveis do Ministério da Saúde, “os malefícios do álcool são tão impactantes que o ministério recomenda consumo zero. Quanto menos, melhor. Não importa se a meta é ou não realista. O que importa é salvar vidas”.
O Dr. Jaber explica: “O álcool é uma substância tóxica e, como tal, altera o metabolismo. Ele danifica o sistema imunológico, além de aumentar o risco de câncer e lesiona pâncreas, fígado e rim.” Ainda segundo ele, quem bebe diariamente “desenvolve tolerância e precisa de cada vez mais quantidade.”
A psiquiatra Ana Cecília Marques, presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e Outras Drogas (ABEAD), endossa a recomendação do Ministério da Saúde. Porém, considera que ela “não é eficaz”.
Vários fatores – incluindo cultura, história e economia de cada país – fazem com que a maioria beba. Em muitos países, a bebida faz parte das refeições e dos rituais sociais. “Se for beber”, diz, “siga a recomendação da OMS: homens não devem consumir mais que três doses por situação e mulheres, duas”.
Em última análise, tudo se resume às opções pessoais
“Quem tem histórico de uso de drogas, transtorno alimentar, doença mental ativa – principalmente depressão, trauma ou ansiedade – ou doenças físicas como diabetes e problemas hepáticos e renais, deve se abster, pondera Ana Cecília, da ABEAD. “Nesses casos a chances de agravamento do quadro é muito alta.”
As diretrizes só são úteis quando lhes damos atenção. Em última análise, é claro que tudo se resume geralmente às opções pessoais. Tande Coelho, por exemplo, parou de consumir bebidas alcoólicas. Entretanto, ressalva que só deixaria de beber cerveja por orientação médica em caso de doença grave.
“Sempre pratiquei exercícios para compensar a vida boêmia. Corro três vezes por semana. Uma forma de manter a saúde em dia e o corpo funcionando bem”, diz Tande.