O labrador Ice, um dos melhores cães de busca da América Latina, tornou-se o primeiro cão bombeiro do Brasil. E está sendo treinado para salvamentos no mar.
Quem já era o melhor amigo do homem em terra agora passou a ser também na água. A cerca de 30 metros da areia, entre a segunda e a terceira arrebentação de ondas, uma criança é arrastada. Há ali uma corrente de retorno. Tentando socorrê-la, seus pais e irmã mais velha entram também em perigo. Atiram-se ao mar os três guarda-vidas lotados na praia acompanhados do labrador Ice. Ice está devidamente uniformizado em seu colete vermelho e leva um flutuador, o lifebelt, amarrado à guia. Os guarda-vidas deixam as três primeiras vítimas em segurança na margem. O cão contorna a quarta, mantendo uma distância mínima de um metro. Então põe a boia ao seu alcance, de modo a apoiá-la e evitar que se afogue enquanto aguarda o resgate.
Um labrador salva-vidas?
Isso mesmo. O cão bombeiro Ice, com 7 anos, tornou-se o primeiro a atuar em salvamentos aquáticos no Brasil. Isso acontece desde o verão de 2017, na praia de Cabeçudas, em Itajaí (SC). O local foi escolhido para a Operação Veraneio por apresentar, com certa regularidade, afogamentos múltiplos. Provavelmente por causa do grande número de famílias que a frequenta. O turno de Ice vai das 15h às 20h, quando o sol é mais ameno, exceto uma vez por semana, em que participa de um projeto cinoterapêutico no Hospital Marieta Konder. Ice, o cão guarda-vidas não usa coleira e tem crachá para andar pelo hospital e levar alegria aos pacientes.
Se não há ocorrências, o labrador fica na sombra e é constantemente hidratado. A presença do cão está sendo bem-recebida pela comunidade e facilita a interação entre guarda-vidas e banhistas. E isso favorece a disseminação de orientações de segurança.
Ice tem oito certificações internacionais e um currículo que inclui experiência na tragédia de Mariana (MG). É considerado um dos melhores cães de busca da América Latina. Ele foi treinado desde os dois meses de vida pelo terceiro sargento Evandro Amorim, do 7oBatalhão de Bombeiros Militar, que o criou na praia: sua preparação física sempre incluiu exercícios no mar. Os labradores são uma raça de trabalho desenvolvida no Canadá para atividades aquáticas a baixíssimas temperaturas e, por isso, apresentam uma pelagem dupla, espessa e impermeável, além de membranas entre os dedos, como nadadeiras, e um rabo forte que faz as vezes de remo.
O salvamento aquático com cães
Esse tipo de salvamento é utilizado e difundido na Europa, em países como Itália e Inglaterra. O projeto-piloto no Brasil foi idealizado pelo tenente-coronel Charles Vieira, comandante do 7oBBM, e desenvolvido em Itajaí pelo terceiro sargento Amorim, tutor de Ice, em parceria com seu filho, o soldado Thiago Amorim, que o auxiliou no treinamento. A preparação do labrador levou 11 meses e, como toda a capacitação para trabalho junto ao corpo de bombeiros, foi uma grande brincadeira para Ice: os exercícios são sempre prazerosos, de modo que o cão tenha vontade de repeti-los.
Com o balanço oficial dos resultados da Operação Veraneio, a meta é ampliar o serviço tanto no número de cães – que serão selecionados para trabalharem especificamente em salvamento aquático, de acordo com sua predisposição, desde filhotes – quanto no de cidades atendidas – o 7o BBM é responsável por boa parte do litoral norte de Santa Catarina e está em diálogo com o Comando-Geral para levar o serviço ao restante do estado.