Para o psiquiatra Max Pemberton, a solidão é um sentimento que todos nós vivenciamos alguma vez na vida. Confira áudio e texto em inglês!
Redação | 30 de Agosto de 2020 às 20:21
“What’s wrong?” I ask. Matthew is about my age, with messy brown hair and the beginnings of a beard. While he comes across as a bit odd sometimes, he’s polite, well behaved; he sits in the TV room, he joins in the activities on the ward, talks to the other patients. “I’m lonely,” he replies.
As a doctor, when I’m called to see a patient and I ask them what’s wrong, it’s usually something fairly straightforward. Even if it turns out to be a little complicated, there are always tests to order, scans to book; I can make some attempt to at least start sorting the problem out. It’s not always like that in psychiatry. Matthew has been acting a bit peculiar recently and the nursing staff are worried. On a psychiatry ward, there’s a high threshold for acting bizarrely, so when the nursing staff are worried, it’s time to act. He’s becoming withdrawn, spending more time in his room and crying in the night. I’d hoped that it was something medical, like an upset stomach. But instead he tells me that he’s lonely.
I’ve been used to working in a team on a ward bustling with people, everyone rushing round. But it’s different here. Now that I’m a more senior doctor, it’s deemed appropriate to give me a whole ward to myself. The consultant psychiatrist I’m working under comes in every few days to check I’m surviving. The rest of the time I’m the only doctor on the ward. So, understandably, I’m finding the job rather lonely. Each ward has a doctor working on it so, in theory, there are other doctors on site, but after security passes have been swiped, doors locked and unlocked, it’s not quite the same. I miss the camaraderie that comes with working on a ward with other doctors and the daily ward rounds. I suppose some consolation can be drawn from the fact that at least I’m not the only one feeling like this.
I’m locked up with a lot of other lonely people. Matthew hasn’t got any friends. I try and suggest some things he could do when he’s discharged, clubs and groups he could join. But he shakes his head. He’s not stupid, he knows what other people his age do. He knows that other people his age aren’t hearing voices, or having to have medication injected into them to control their psychosis. What he needs is something that I can’t prescribe. I can’t conjure up a group of ready-made friends who’ll accept him for who he is: someone who plays football, who watches Celebrity Big Brother (no one’s perfect), enjoys going to concerts and who’s got schizophrenia.
It’s isolating and I’m not sure what, as a doctor, I can do about that. For people with severe, enduring mental illness it’s a life sentence. They don’t fit in, and people in the outside world don’t usually want to mix with people like them.
“What about the other people on the ward? Have you made friends with any of them?” I ask.
“They aren’t my age, and none of them are into the same things as me,” he replies.
“Will you be my friend?” he asks after some time. I really wanted to say yes, but I knew that more than it possibly being unprofessional, it would also be a lie. I’m not his friend because I’m his doctor. That therapeutic relationship works because to a greater or lesser extent the doctor is detached from the patient. He can tell what my answer is going to be, sighs and looks out of the window. “I wish I was normal,” he says. I want to tell him that sometimes feeling lonely is the most normal thing in the world.
Tradução…
– O que você tem? – pergunto.
Matthew é mais ou menos da minha idade, com o cabelo castanho despenteado e o início de uma barba. Às vezes dá impressão de ser um pouco estranho, mas é educado e bem comportado; senta-se na sala de TV, participa das atividades da ala, conversa com outros pacientes.
– Eu me sinto só – responde ele.
Como médico, quando sou chamado para ver um paciente e pergunto o que ele tem, normalmente é algo bastante simples. Mesmo que acabe se revelando um pouco complicado, há sempre exames para pedir, tomografias para marcar; posso fazer uma tentativa de ao menos começar a resolver o problema. Na psiquiatria nem sempre é assim. Matthew vem se comportando de um modo um tanto peculiar recentemente e a equipe de enfermagem está preocupada. Como em uma ala psiquiátrica há um limiar alto para comportamentos estranhos, quando a equipe de enfermagem está preocupada é hora de agir. Ele está retraído, passando mais tempo no quarto e chorando à noite. Eu esperara que fosse algum problema físico, como uma dor de estômago. Mas, ao contrário, ele me diz que está se sentindo sozinho.
Eu me habituei a trabalhar em equipe, numa ala fervilhando de gente, todos apressados de um lado para outro. Mas aqui é diferente. Agora que sou um médico mais graduado, consideraram adequado que eu tivesse uma ala inteira para mim. O psiquiatra a quem me reporto vem frequentemente verificar se estou sobrevivendo. O restante do tempo sou o único médico da ala. Portanto, compreensivelmente, estou achando o trabalho bem solitário. Como cada ala tem um médico próprio, em teoria existem outros médicos no local, mas depois que passes da segurança foram roubados, portas trancadas e destrancadas, não é a mesma coisa. Sinto saudade da camaradagem que se cria quando trabalhamos numa ala com outros médicos e de passar visitas diárias aos pacientes. Suponho que posso encontrar algum consolo no fato de não ser o único a me sentir assim.
Estou trancado junto com outras pessoas solitárias. Matthew não tem nenhum amigo. Tento sugerir algumas coisas que ele poderia fazer quando recebesse alta, clubes e grupos que poderia frequentar. Mas ele sacode a cabeça. Ele não é burro, sabe o que as outras pessoas de sua idade fazem. Sabe que as outras pessoas de sua idade não ouvem vozes nem tomam injeções com medicamentos para controlar a psicose. Ele precisa de algo que não posso prescrever. Não posso convocar um grupo de amigos prontos que vão aceitá-lo como é: alguém que joga futebol, que assiste o Big Brother Celebridades (ninguém é perfeito), que gosta de ir a shows e que tem esquizofrenia.
Ela leva ao isolamento, e não tenho certeza do que eu, como médico, posso fazer a esse respeito. Para quem sofre de uma doença mental grave e duradoura, é uma pena de prisão perpétua. Essas pessoas não se encaixam, e quem está do lado de fora normalmente não quer se associar a elas.
– E as outras pessoas da ala? Você fez amizade com alguém? – pergunto.
– Elas não têm a minha idade, e nenhuma das meninas tem interesse nas mesmas coisas que eu.
– Você quer ser meu amigo? – pergunta ele um tempo depois.
Eu realmente queria responder “sim”, mas sabia que, mais do que possivelmente pouco profissional, também seria uma mentira. Não sou amigo dele porque sou seu médico. Esse relacionamento terapêutico funciona porque, em maior ou menor medida, o médico está distanciado do paciente.
Ele percebe qual vai ser minha resposta, suspira e olha pela janela.
– Eu queria ser normal – lamenta.
E eu quero dizer a ele que às vezes sentir-se só é a coisa mais normal do mundo.