Tradução…
– O que você tem? – pergunto.
Matthew é mais ou menos da minha idade, com o cabelo castanho despenteado e o início de uma barba. Às vezes dá impressão de ser um pouco estranho, mas é educado e bem comportado; senta-se na sala de TV, participa das atividades da ala, conversa com outros pacientes.
– Eu me sinto só – responde ele.
Como médico, quando sou chamado para ver um paciente e pergunto o que ele tem, normalmente é algo bastante simples. Mesmo que acabe se revelando um pouco complicado, há sempre exames para pedir, tomografias para marcar; posso fazer uma tentativa de ao menos começar a resolver o problema. Na psiquiatria nem sempre é assim. Matthew vem se comportando de um modo um tanto peculiar recentemente e a equipe de enfermagem está preocupada. Como em uma ala psiquiátrica há um limiar alto para comportamentos estranhos, quando a equipe de enfermagem está preocupada é hora de agir. Ele está retraído, passando mais tempo no quarto e chorando à noite. Eu esperara que fosse algum problema físico, como uma dor de estômago. Mas, ao contrário, ele me diz que está se sentindo sozinho.
Sei como ele se sente
Eu me habituei a trabalhar em equipe, numa ala fervilhando de gente, todos apressados de um lado para outro. Mas aqui é diferente. Agora que sou um médico mais graduado, consideraram adequado que eu tivesse uma ala inteira para mim. O psiquiatra a quem me reporto vem frequentemente verificar se estou sobrevivendo. O restante do tempo sou o único médico da ala. Portanto, compreensivelmente, estou achando o trabalho bem solitário. Como cada ala tem um médico próprio, em teoria existem outros médicos no local, mas depois que passes da segurança foram roubados, portas trancadas e destrancadas, não é a mesma coisa. Sinto saudade da camaradagem que se cria quando trabalhamos numa ala com outros médicos e de passar visitas diárias aos pacientes. Suponho que posso encontrar algum consolo no fato de não ser o único a me sentir assim.
Estou trancado junto com outras pessoas solitárias. Matthew não tem nenhum amigo. Tento sugerir algumas coisas que ele poderia fazer quando recebesse alta, clubes e grupos que poderia frequentar. Mas ele sacode a cabeça. Ele não é burro, sabe o que as outras pessoas de sua idade fazem. Sabe que as outras pessoas de sua idade não ouvem vozes nem tomam injeções com medicamentos para controlar a psicose. Ele precisa de algo que não posso prescrever. Não posso convocar um grupo de amigos prontos que vão aceitá-lo como é: alguém que joga futebol, que assiste o Big Brother Celebridades (ninguém é perfeito), que gosta de ir a shows e que tem esquizofrenia.
A doença mental é solitária
Ela leva ao isolamento, e não tenho certeza do que eu, como médico, posso fazer a esse respeito. Para quem sofre de uma doença mental grave e duradoura, é uma pena de prisão perpétua. Essas pessoas não se encaixam, e quem está do lado de fora normalmente não quer se associar a elas.
– E as outras pessoas da ala? Você fez amizade com alguém? – pergunto.
– Elas não têm a minha idade, e nenhuma das meninas tem interesse nas mesmas coisas que eu.
– Você quer ser meu amigo? – pergunta ele um tempo depois.
Eu realmente queria responder “sim”, mas sabia que, mais do que possivelmente pouco profissional, também seria uma mentira. Não sou amigo dele porque sou seu médico. Esse relacionamento terapêutico funciona porque, em maior ou menor medida, o médico está distanciado do paciente.
Ele percebe qual vai ser minha resposta, suspira e olha pela janela.
– Eu queria ser normal – lamenta.
E eu quero dizer a ele que às vezes sentir-se só é a coisa mais normal do mundo.
By Max Pemberton