A Khan Academy, um novo modelo de educação, foi desenvolvida em 2004. Tudo começou quando a prima do matemático Salman Khan precisou de ajuda para
Redação | 14 de Setembro de 2018 às 09:00
A Khan Academy, um novo modelo de educação, foi desenvolvida em 2004. Tudo começou quando a prima do matemático Salman Khan precisou de ajuda para entender melhor a matéria. De lá para cá, o que começou como uma aula particular em família se transformou numa plataforma completa e inovadora de ensino da matemática. Descubra o início da Khan Academy, seus conceitos, e inspire-se a tirar suas ideias do papel.
A toda pelo Vale do Silício, rumo a Los Altos, o motorista do táxi aponta a sede de todas as grandes empresas de tecnologia de que já ouvi falar.“Lá está a Microsoft. A Intel. Ali atrás fica o Yahoo…”, diz ele.
Meu destino é Mountain View, lar da Khan Academy, instituição minúscula e sem fins lucrativos. Palavras como “revolucionária” e frases como “que vai mudar o mundo” são usadas para descrever essa iniciativa, cujo núcleo é o site que exibe aulas gratuitas em vídeo e oferece exercícios interativos. Além de dar ao seu fundador, Salman Khan, um lugar na lista das cem pessoas mais influentes de 2012 da revista Time, esse centro de ensino virtual sediado na Califórnia recebeu apoio de grandes nomes, como Bill Gates. “Sal Khan é um pioneiro”, disse à revista o fundador da Microsoft. “[Seu] impacto sobre a educação pode ser verdadeiramente incalculável.”
O mundo começa a prestar atenção nele. O vídeo “Vamos usar vídeo para reinventar a educação”, já foi visto por mais de 3 milhões de pessoas. A palestra de 20 minutos foi gravada na conferência da fundação TED (Tecnologia, Entretenimento, Design).
A semente da Khan Academy foi plantada em 2004, quando Khan ajudava a prima Nadia, 12 anos, com seus deveres de matemática. Khan, na época analista de fundos hedge, havia se formado em matemática (além de informática e engenharia elétrica) no Massachusetts Institute of Technology (MIT). Depois, fez mestrado em informática e engenharia elétrica na mesma instituição. Como morava em Boston e Nadia, em Nova Orleans, Khan usou a função Doodle do Yahoo! Messenger. Seu objetivo era ilustrar conceitos para ela enquanto falavam ao telefone. Também codificou um programa que gerava exercícios que ela poderia resolver pela Internet.
Quando viram que Nadia estava melhorando nos estudos, Arman e Ali, seus irmãos, pediram ajuda a Khan. Os amigos seguiram o exemplo até que ficou difícil dar aulas individuais às crianças. Um amigo sugeriu que ele criasse vídeos e os colocasse no YouTube. No começo, ele resistiu, convencido de que o YouTube era para “gatos tocando piano”. Mas, no fim de 2006, publicou o primeiro vídeo.
Agora no Vale do Silício, Khan converteu um cômodo da sua casa num miniescritório. Como trabalha no horário da costa leste e, portanto, tem a tarde livre, ele continuou a desenvolver programas e ferramentas analíticas relacionados às aulas em vídeo.
Khan criou uma plataforma que acompanha o progresso de cada aluno. Nela, é possível acompanha os módulos que já terminaram, como foi o desempenho nos exercícios, a que vídeos assistiram e quanto tempo passaram vendo cada aula. O aluno marcado em verde vai bem. As barras amarelas indicam que um módulo está incompleto; o vermelho mostra que o aluno tem dificuldades. Os alunos podem acompanhar o próprio progresso e dominar um tópico antes de passar para os próximos, de acordo com os “mapas do conhecimento”.
Cinco anos depois, Khan largou o fundo hedge e se dedicou em horário integral a desenvolver os recursos da Khan Academy. Embora tenha tido um começo modesto, desde o princípio sua visão era ampla. Quando preenchia a papelada do imposto de renda, em 2007, pediram-lhe que detalhasse a missão da sua empresa sem fins lucrativos. “Eu poderia ter escrito: ‘Quero fazer um repositório de vídeos e exercícios gratuitos na Internet.’ Mas missão é algo que a gente busca”, diz ele. “Então, escrevi: ‘Educação gratuita do mais alto nível para qualquer um, em qualquer lugar.’”
“Queríamos uma declaração de missão que nunca nos permitisse dizer: ‘Acabamos.’”
A crescente equipe da Khan inclui várias pessoas que deixaram empregos de altos salários. Shantanu Sinha, antigo rival no curso secundário e seu colega de quarto na faculdade, era o presidente e diretor-executivo. Já Sundar Subbarayan, o diretor de implementação escolar. “Em geral, quando alguém vai para uma empresa iniciante, a promessa é de riqueza, mas aqui a promessa é criar um impacto capaz de mudar o mundo”, diz Subbarayan.
Aspirar a um objetivo educacional tão elevado não parecia ser a sina de Salman Khan. Ele nasceu em Nova Orleans. O casamento do pai, nascido em Bangladesh, com a mãe indiana foi arranjado. Ele já brincou dizendo que os atrativos da Louisiana para a sua família eram óbvios. “Havia comida apimentada, umidade, baratas gigantescas e um governo corrupto” – assim como na pátria do casal no sul da Ásia -, comentou.
Ele foi criado apenas pela mãe e frequentou escolas públicas, nas quais descobriu o talento para a matemática. “No secundário, o aluno que quisesse ser realmente bom e competitivo, que quisesse tirar sempre a nota máxima e ser o melhor da classe, tinha de se dedicar com um pouco mais, e foi o que eu fiz”, diz ele.
Khan é muito inteligente, mas também muito engraçado, autodepreciativo e atento. Tem a imaginação ilimitada dos cientistas da computação misturada à precisão dos matemáticos e a adorável esquisitice dos dois. Sua generosidade e autoconfiança são transmitidas pelos vídeos que faz e que mantém deliberadamente simples. Ouvimos apenas a sua voz enquanto ele faz os diagramas passo a passo no quadro-negro eletrônico. É como se fosse um amigo sentado ao nosso lado. O site dispõe do currículo completo de matemática, refletindo a sua origem e especialidade. Mas, também oferece vídeos nas áreas de ciências, informática, finanças, economia e ciências humanas.
Khan escreveu um livro sobre a visão que tem da educação: Um mundo, uma escola – a educação reinventada. Ele descreve o que pensa do futuro da educação, com o aprendizado no ritmo do próprio aluno e a ideia da “sala de aula invertida”. Nesse conceito, os alunos aprendem pela Internet, fora da escola, e fazem o “dever de casa” em sala de aula. Ele também questiona ortodoxias ocidentais, como o número de anos que se deve frequentar a escola, a idade de começar e por que achamos sensato passar para outro tópico de estudo sem que haja o domínio do anterior.
De acordo com Khan, “é errado achar que esse projeto pretende substituir os professores”. Ele explica: “Os professores serão muito mais valiosos no futuro, porque [a sala de aula] será um lugar mais interativo. Eles terão de fazer o que os computadores não fazem, ou seja, formar vínculos, motivar, orientar, diagnosticar”.
“Quem percebe que esse é um auxílio fantástico para os professores entende nosso objetivo”, concorda Subbarayan. “O aprendizado é centrado no aluno, e assim […] o professor pode ser mais um guia e orquestrador dos alunos no aprendizado. […] O valor do professor aumenta.”
É tarde da noite quando deixo Los Altos. Após dez minutos de silêncio mutualmente agradável, de repente o motorista do táxi anuncia que estamos passando pelo Centro de Pesquisa da Nasa.
Numa comunidade rica em inovações, a exploração de outros planetas parece ter capturado o interesse dos moradores. Isso me faz lembrar das estantes do escritório de Khan, cheias de livros de ficção científica como os de Isaac Asimov e Ursula Le Guin.
“Assim como a informática, a ficção científica também está ausente do sistema escolar”, diz ele. “No entanto, ela é muito importante, porque trata de sonhos. Adoro os romances vitorianos, o modo como transmitem as nuances da condição humana. Mas também é preciso sonhar, e isso, no momento, está faltando entre nós.”
Por Pip Cummings
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