A satisfação profissional pode ser conquistada por todos, independentemente da condição intelectual e dos limites que a sociedade impõe.
Redação | 24 de Abril de 2019 às 12:14
No verão de 2010, Deborah Barrett e seu filho, Anthony, saíram de um restaurante perto da escola Edmonton, na qual ele havia se formado dois anos antes. Eles tinham se oferecido para lavar pratos lá a fim de dar a Anthony algo o que fazer, mas, ao deixarem o lugar, encharcados, raios de sol atravessaram as nuvens e Deborah teve um insight: meu filho não vai passar a vida numa pia de lavar louça.
Limpar pratos não é a única opção para a maioria dos graduados do ensino médio. Mas Anthony tem autismo e é basicamente não verbal, com exceção de breves palavras ao responder a perguntas do tipo “sim ou não” e dos sons de Iiiiiii que ele faz quando está animado, feliz ou frustrado. Depois que uma pessoa com deficiência intelectual conclui o período escolar, “não há vida para ela”, diz Deborah. Os programas educativos terminam, e as opções de emprego são geralmente simplórias.
Quando o filho entrou na casa dos 20 anos, Deborah analisou o que ele poderia fazer e do que ele gostava. Entre as atividades que lhe davam prazer estavam passear de carro e carregar coisas, bem como conhecer novos lugares, mas não por muito tempo. Talvez ele pudesse ser um entregador… O problema: Anthony não anda muito rápido, e o trabalho de entregador exigiria que sua equipe de apoio atuasse como motorista e colega de trabalho.
Isso não foi um problema para Mike Hamm. Em 2012, ele se tornou o novo assistente de Anthony e abraçou o plano de gastar parte de seus dias fazendo entregas com ele. A dupla chamou a empreitada de Anthony at Your Service [que significa: Anthony a Seu Dispor], cadastrou alguns clientes (uma loja de balões, uma empresa de ortodontia) e partiu no sedã dourado de Hamm.
Na tentativa de conquistar mais negócios, Hamm publicou um vídeo no YouTube que mostrava o amor de Anthony pelo jogo educativo Math Blaster, também mostrava-o nadando e balançando a cabeça ao som de música eletrônica. “Ele é um dos caras mais felizes que conheço”, diz Hamm, ao narrar o vídeo. O novo projeto de Anthony, continua ele, é sua empresa. “Vamos entregar tudo o que conseguirmos carregar – quer dizer, tudo que Anthony conseguir carregar.”
Em poucos dias, o vídeo alcançou 100 mil visualizações. A Anthony at Your Service estava bombando.
Sete anos depois, caixas aguardando distribuição ficam empilhadas na entrada da casa onde Anthony, agora com 30 anos, mora com Deborah e o marido dela, David. A empresa hoje possui 24 equipes de entregas – cada uma formada por um empresário com deficiência intelectual e seu assistente de apoio – em Edmonton e Calgary.
Jesse Andrew, de 30 anos, que tem paralisia cerebral, trabalha na empresa desde 2017. “A Anthony at Your Service me dá a chance de fazer um trabalho em que eu possa me destacar”, diz ele.
Quanto aos clientes, o que eles recebem da Anthony at Your Service – que cobra a partir de 30 dólares por entrega e paga aos seus motoristas um salário mínimo mais quilometragem – é algo que a FedEx não faz. “Eles estão conectados com a minha empresa como qualquer funcionário”, diz Laine Cherkewick, co-fundadora da loja de sanduíches Farrow, em Edmonton, que utiliza o serviço até 10 vezes por semana para pedidos de bufê.
Lançar uma empresa que emprega 24 pessoas com deficiência intelectual, e toda a logística que acompanha o processo, não fazia parte do plano original, diz Deborah. Mas a realidade do trabalho de courier – os altos e baixos dos pedidos, as longas horas – impedia que Anthony e Hamm carregassem o fardo sozinhos. E o feedback que ela recebeu das comunidades de autistas e de pessoas com deficiência intelectual sugeriu que esses indivíduos gostariam de trabalhar num lugar que os compreendesse.
Gerenciar a Anthony at Your Service se tornou o trabalho principal, mesmo que não remunerado, de Deborah – ela desistiu de sua prática de psicoterapia e da presidência da Sociedade de Autismo de Alberta alguns anos atrás. “O que estou fazendo pelo Anthony hoje fez mais diferença em sua vida do que qualquer outro trabalho”, conta ela. “Queremos criar empregos para as pessoas com todos os tipos de habilidades e deficiências.”
Em um dia típico de entrega, Hamm e Anthony levam juntos o pacote até o estabelecimento, porém, depois de sete anos, isso também está evoluindo. Hoje, Anthony já consegue entrar sozinho em algumas lojas para fazer seu trabalho.