O autor descreve a primeira vez que teve contato com uma fruta exótica para os ocidentais – o durião –, em Bangcoc, e as sensações que experimentou.
Redação | 12 de Abril de 2019 às 09:00
Meu relógio marcava cinco minutos para o meio-dia. Peguei os cadernos e saí correndo da sala de aula, gritando aos meus alunos: “Terminem a leitura para a aula de amanhã!”
Desci em disparada a escada e cheguei ao portão da universidade. Como eu esperava, o bonde do meio-dia já dobrava a esquina. Quando diminuiu a marcha antes da parada, embarquei com um pulo. Meu destino ficava dali a dois pontos.
Avistei meu amigo Sompot Upa-in, professor da Universidade Silpakorn, fazendo sinais frenéticos para que eu saltasse do bonde. Levantei-me, cambaleei até os degraus na traseira do bonde e dei um salto de balé até o meio-fio.
“Tudo bem?”, consegui perguntar enquanto ele me puxava, ajudando-me a levantar.
Então senti na rua um cheiro penetrante de decomposição vegetal e vi montes do que pareciam maças medievais amontoadas pelo meio-fio e diante das lojas. Algumas eram oblongas como bolas de futebol americano, outras redondas e do mesmo tamanho de bolas de futebol comum, mas todas tinham grandes pontas, como blocos de ferro espinhentos para esmagar crânios protegidos por capacetes, nos combates entre cavaleiros da Idade Média.
Não liguei o cheiro ao aspecto. Bangcoc é cheia de odores, alguns agradáveis, outros definitivamente repelentes. Aquele era um desses cheiros acres, capazes de ressecar o nariz.
Sompot me ajudou a limpar os cadernos e salvou-me do perigo das reluzentes rodas de aço do bonde.
– Não vá morrer por enquanto – disse ele. – Uma experiência nova e maravilhosa o aguarda.
Eu ainda estava abalado.
– Entre ali – ordenou ele.
Ladeando a entrada do restaurante refrigerado para onde me arrastou, havia mais daquelas maças medievais, só que de um tom castanho-claro, misturado com verde, em vez da aparência de metal enferrujado.
– O que é isso? – perguntei.
– Depois, depois – disse Sompot. – Você vai ter um prazer imenso. Sente-se e peça uma bebida. Sugiro água, água pura e gelada.
Ele saiu e, pela janela do restaurante, eu o vi pegar e examinar um daqueles vegetais de aspecto pouco amistoso, virando-o com cuidado, como se o pesasse. O rapaz que o atendia enfiou no fruto uma faca afiada e cortou uma tira da casca espessa, expondo o interior amarelo-ouro da fruta. Meu amigo pagou e voltou para o restaurante. Entregou a fruta espinhenta a um garçom e sentou-se.
– Água, água pura – pediu.
– Você ainda não me contou o que é esse negócio espinhento. E o que houve com os esgotos daqui? Tudo tem um mau cheiro novo, diferente de ontem. – Teria o Rio Chao Phrava refluído pelos esgotos?
Sompot riu.
– São duriões. Acabaram de chegar das plantações.
– Duriões! – Eu já ouvira esse nome, pronunciado por um estrangeiro, que torcera o nariz, com asco, ao dizer a palavra.
Muitos que visitam a Tailândia já leram sobre o mau cheiro do durião e como a fruta pode ser perigosa se cair em seu para-brisa… ou em sua cabeça. Na Malásia, muitas vezes se estendem redes sob as árvores a fim de aparar as frutas que caem, antes que derrubem algum pobre mortal.
Apesar da reputação de afrodisíaca, é considerada perigosa se acompanhada de bebida alcoólica.
Como disse um malaio: “Depois de comer muito durião, uma dose de bebida forte pode derrubar você na hora!” Portanto, é uma fruta que tem certa fama.
O dono do restaurante voltou com uma bandeja e dois pratos. Com técnica cirúrgica, enfiou a faca na casca dura, torceu-a e partiu a fruta em duas partes. Em cada uma havia vários gomos amarelo-ouro, como ovos de dinossauro num ninho aconchegante.
Sompot me observava.
– Agora puxe um deles… Assim, tire-o e coma devagar. Aprecie o sabor e a textura. Hum… – Respirou fundo. – Este é dos bons. Chama-se mon thong, o “travesseiro dourado”. É um dos melhores. Ande, use o polegar, puxe e saboreie bem.
Nesse dia começou meu caso de amor com o durião e seu cheiro forte e aparência de arma. Embora fosse pesado e difícil de segurar por causa dos espinhos, a polpa era macia como um pudim. Quando peguei um gomo, meus dedos afundaram nele. Levei-o ao nariz.
– Não fede! – A polpa praticamente derreteu em minha boca. – Nunca provei nada igual. Que sabor é este? – murmurei.
Já ouvira alguém dizer que o gosto se assemelhava a algo morto e apodrecido. A mim pareceu mais uma feliz sinfonia de banana, caramelo, baunilha e pasta de alho ou cebola.
Sompot foi menos analítico.
– A maior parte das pessoas se limita a comer, lamber os dedos e pegar mais.
– É bom mesmo – eu disse, com entusiasmo, enfiando o dedo para apanhar outro gomo.
– Vá devagar! Se comer demais vai ter ron nai.
– Azia – traduzi, abandonando toda a cautela.
Mais tarde, soube que o durião, Durio zibethinus, pertence à família das bombacáceas, que inclui o baobá, árvore africana de tronco grosso, a sumaúma e o pau-de-balsa sul-americano. O durião, nativo do Sudeste da Ásia, é cultivado sobretudo na Indonésia, Malásia e Tailândia, onde, após cuidadosa seleção de mudas naturais, produzem-se diversas variedades de frutas comestíveis (deliciosas!).
A maioria amadurece em seis semanas, de maio a junho. Isso resulta em um verdadeiro Himalaia de duriões. A exportação é dificultada pela urgência de levar os duriões até Hong Kong, Taiwan e Malásia. O durião também é exportado para os Estados Unidos, o Canadá e a Europa. Alguns entusiastas podem chegar a pagar até 1.200 baht (cerca de 30 dólares) por um durião fora da estação.
Os hotéis de primeira classe em Bangcoc proíbem os hóspedes de levar duriões para seu interior. Isso também se aplica às companhias aéreas. Temem que o odor penetre no ar-condicionado!
Como Sompot avisou, o durião pode causar azia. Descobri que era verdade depois de devorar um inteiro.
A advertência de meu amigo também foi feita pela Dra. Saiyud Niyomviphat, durante um seminário sobre diabete em Bangcoc. O durião tem alto teor calórico, com muito fósforo e açúcar, o que pode elevar o nível do colesterol. Quando um participante perguntou à médica se os diabéticos deviam evitá-lo por completo, ela riu. “Se conseguir se limitar a uma porção assim de durião”, e mostrou a mão fechada, “é provável que não tenha problemas.” Depois acrescentou: “Para os verdadeiros adeptos do durião, será quase impossível restringir-se a uma porção tão pequena! Nesse caso, você deverá reduzir outros alimentos calóricos, se já comeu durião nesse dia.”
As risadas da plateia pareceram provar que ela estava certa.
Nem sei quantos duriões já comi desde que fui apresentado à “rainha das frutas” naquele dia, há mais de 30 anos. Centenas, talvez, mas sei que eu mesmo nunca escolhi nenhum. Sempre deixei que outra pessoa, mais conhecedora, ou o vendedor escolhesse por mim.
Mas, se eu morasse sozinho numa ilha onde houvesse duriões, morreria de fome, pois não consigo descobrir o jeito de abrir essa fruta.
No entanto, querer é poder. Se o vendedor não o abrir e eu não estiver num restaurante em que o garçom saiba fazer a operação necessária, posso ir até a rua e acenar para um táxi. Talvez o motorista me preste esse favor. Certamente eu o recompensarei se conseguir saborear minha fruta favorita: Sua Majestade, o Durião.