Meditação: tenha paz a qualquer hora, em qualquer lugar

Se você me dissesse há poucos anos que um dia eu me tornaria um defensor da meditação, eu tossiria a cerveja pelo nariz. Em 2004, tive uma crise de pânico

Redação | 1 de Junho de 2020 às 01:01

julief514/iStock -

Se você me dissesse há poucos anos que um dia eu me tornaria um defensor da meditação, eu tossiria a cerveja pelo nariz.

Em 2004, tive uma crise de pânico no trabalho. Infelizmente para mim, isso aconteceu diante de milhões de pessoas, quando eu dava as notícias ao vivo no jornal Good Morning America, da rede de TV ABC. Depois da crise em rede nacional, eu soube que tinha depressão não diagnosticada. Durante meses, tivera dificuldade para me levantar da cama pela manhã e me sentia como se tivesse febre baixa permanentemente.

A crise de pânico acabou me levando a adotar uma prática que sempre desdenhei como ridícula. Durante quase toda a vida, nas poucas vezes em que sequer pensei em meditação, eu a colocava ali juntinho da cantora Enya e das leituras da aura. Além disso, imaginei que minha mente apressada era ocupada demais para comungar com o cosmo. Seja como for, se eu ficasse demasiado feliz, provavelmente me tornaria ineficaz em meu emprego hipercompetitivo.

Duas coisas me fizeram mudar de ideia. A primeira foi a ciência. Em anos recentes, houve uma explosão de pesquisas sobre meditação, e foi comprovado que ela reduz a pressão arterial, promove a recuperação depois que o corpo libera cortisol (o hormônio do estresse), fortalece o sistema imunológico, retarda a atrofia do cérebro ligada à idade e mitiga os sintomas da depressão e da ansiedade. Os estudos também mostram que a meditação reduz a violência nas penitenciárias, aumenta a produtividade no local de trabalho e melhora tanto o comportamento quanto as notas das crianças na escola.

A situação fica interessante quando olhamos a neurociência. Em anos recentes, ao examinar a cabeça de meditadores, pesquisadores constataram que a prática pode reformular partes importantes do cérebro envolvidas na autoconsciência, na compaixão e na resiliência. Um estudo publicado na Harvard Gazette demonstrou que apenas oito semanas de meditação resultaram em redução mensurável da matéria cinzenta na área do cérebro associada ao estresse.

A segunda coisa que me fez mudar de ideia sobre a meditação é que ela não envolve necessariamente um monte de coisas “esquisitas” como eu temia. Ao contrário da crença popular, a meditação não exige se enrolar como um pretzel, fazer parte de um grupo nem usar roupas especiais. A palavra meditação é um pouco parecida com a palavra esporte – há centenas de variedades. O tipo de meditação discutida aqui é chamada de atenção plena, deriva do budismo e não exige adotar um sistema de crenças nem se declarar budista.

Comecei minha prática devagar, com apenas 5 a 10 minutos por dia, que é o que recomendo a todo mundo no início. (Francamente, mesmo que você só encontre tempo para um minuto por dia, pode contar isso como uma vitória.)

A prática fica mais fácil com o tempo, mas, depois de meditar durante anos, eu ainda me perco. Eis uma amostra aleatória de meu bate-papo mental durante uma sessão:

Inspira.

Expira.

Cara, estou bem agitado. Como era a palavra em ídiche que minha avó usava nesses casos? Shpilkes. Isso.

Palavras que me fazem rir: unguento, pianista.Volte à respiração.

Inspira.

Expira.

Gosto de bolos e biscoitos.

Não gosto de chapéu fedora, sonhos em sequência, música techno.

Cara. Para com isso.

Inspira.

Expira.

Inspira.

Empregos alternativos: núncio papal, dançarino, trabalho em dupla jornada na linha da sedução…

Você já entendeu.

Como começar a meditar?

Para lhe dar uma noção de como é mesmo simples, eis os três passos das instruções para começar a meditar.

Sente-se confortavelmente

É melhor ter a coluna ereta, para prevenir cochilos involuntários. Se quiser se sentar de pernas cruzadas no chão, faça isso. Caso contrário, sente-se numa cadeira, como eu faço. Feche os olhos ou, se preferir, deixe-os abertos e fixe-os num ponto neutro no chão.

Leve toda a sua atenção à sensação da respiração entrando e saindo

Escolha um ponto onde ela seja mais fácil de perceber: no peito, na barriga ou nas narinas. Você não vai pensar sobre a respiração; só vai prestar atenção nas sensações físicas. Para manter o foco, faça uma anotação mental silenciosa a cada entrada e saída de ar, como “inspira” e “expira”.

Toda vez que se pegar divagando, leve a atenção de volta à respiração

Esse terceiro passo é o segredo. Assim que tentar se concentrar na respiração, você terá todo tipo de pensamento aleatório, como: O que há para o almoço? Será que preciso cortar o cabelo? Quem foi Gasparzinho, o fantasma camarada, antes de morrer? Quem foi o Zé do Pipo do bacalhau, e o que ele achava do prato? Isso é normal. A graça do jogo é notar que se distraiu e recomeçar. De novo. E de novo. É como uma flexão de braço para o cérebro. Também é um ato radical: você está rompendo o hábito vitalício de andar por aí numa neblina de ruminações e projeções e se concentrando no que acontece agora.

As pessoas supõem que nunca vão meditar porque não conseguem parar de pensar. Nunca é demais repetir: a meta não é limpar a mente, mas concentrar a mente – alguns nanossegundos de cada vez –, e, quando se distrair, é só recomeçar. Perder-se e recomeçar não é fracassar na meditação. É ter sucesso.

Estou meditando há oito anos e ainda sou bastante ambicioso. Mas hoje não sou mais tão suado, agitado e desagradável como era. A meditação me ajudou a separar as ruminações inúteis do que chamo de angústia construtiva.

Aprendi que, quanto menos encantado a gente fica com a voz interna na cabeça, mais consegue abrir espaço para que surjam pensamentos e sentimentos inteiramente novos. Isso me permitiu ter ainda mais prazer com meu trabalho, minha mulher e nosso filho Alexander, que me enche de ternura quando me oferece um croquete de frango ou usa minha manga para limpar o bolinho amassado. Não fico tanto nas garras de meus desejos e aversões, o que me deu um ponto de vista mais amplo e, às vezes, uma provinha de um relaxamento profundo e inefável. Em resumo, a meditação nos dá o poder de aproveitar o que está atrás ou além do ego. Pode chamar de criatividade. Pode chamar de sabedoria inata. Há quem chame de coração. Aff.

Quando estiver pronto para ir além

POR DAN HARRIS E JEFFREY WARREN COM CARLYE ADLER do livro meditação para céticos ansiosos