Perder algum ente querido ou pessoa amada não é fácil. No entanto, especialistas em luto nos ajudam a seguir com a vida depois da morte.
Redação | 1 de Maio de 2020 às 01:01
Em 7 de outubro de 2015, antes que o sol nascesse em minha casa no Canadá, fui acordado por um telefonema no qual me avisaram que um de meus amigos mais queridos havia morrido. Jacob foi meu colega no secundário em Cingapura. Eu me sentira atraído por sua personalidade gigantesca, pelo talento impecável para fazer bolos e assados e pelo amor aos amigos. Aos 25 anos, de repente, seu coração parou de bater.
Enquanto os amigos de Cingapura planejavam o velório e o apoio à família, pedi desculpas por não poder pegar um avião e ir até lá. Eu me sentia entorpecido, mas ainda funcional. Já passara por mortes na família, mas aquela era diferente: Jacob foi o primeiro de minha família de amigos escolhidos a morrer. Todos tivemos a mesma sensação imensa de perda, mas me senti sozinho, porque estava a muitos quilômetros do restante do grupo.
O fato é que, embora possa ser universal, o pesar do luto tende a isolar mais do que a unir e nos deixa sem saber processar os sentimentos. Ainda bem que profissionais do luto dão ideias que podem nos ajudar a lidar com a perda.
Embora as reações à morte sejam diferentes entre uma pessoa e outra, o primeiro passo para todos deveria ser uma tentativa de entender a natureza da situação. “O pesar é a reação interna à perda”, diz o Dr. Alan Wolfelt, diretor do Centro de Perda & Transição na Vida de Fort Collins, no estado americano do Colorado. Ele explica que, quando alguém morre, o pesar se apresenta como uma constelação de sentimentos que pode variar da tristeza ao choque, da desorientação à raiva. Em geral, o pesar se exprime de forma previsível, seja física (perda de apetite, insônia ou dificuldade de se concentrar) ou emocionalmente (saudade, arrependimento e até alívio). “Há dimensões diferentes de reação à perda, exclusivas do indivíduo e influenciadas pelas circunstâncias da morte e pelo relacionamento com a pessoa falecida”, diz o Dr. Alan.
Identificar sua reação específica à perda de alguém querido vai ajudar você a decidir de que ferramentas precisa para se orientar. Mas, sejam quais forem, o Dr. Alan insiste em que não devemos nos sentir mal por ter reações intensas. Um terapeuta do luto pode nos ajudar a prestar atenção às àreas que necessitam de um pouco mais de trabalho. “As emoções precisam de movimento”, diz ele. “O luto põe nossas emoções em movimento; em geral, elas irão se suavizar com o tempo.”
Quando passamos pelo pesar, é comum esperar que, algum dia, a dor irá desaparecer por completo. Mas pelo menos uma especialista no setor sugere outra meta. “Muita gente acha que não está passando ‘direito’ pelo pesar porque não atinge esse dito ‘encerramento’. É preciso reformular essas expectativas”, diz Andrea Warnick, psicoterapeuta e terapeuta do luto de Toronto, Canadá. “Não estou tentando ajudar ninguém a ‘superar’ uma morte ou ‘deixar para trás’ alguém que morreu.”
Em vez disso, ela ajuda as pessoas a se manterem ligadas ao falecido. Consolar-se ao falar do morto e recordá-lo é um sinal de que a perda se integrou à vida e é menos provável que crie barreiras à intimidade ou sofrimento psicossomático ao seguir vivendo. Andrea sugere dar a si mesmo permissão de ter saudade do falecido e até cercar-se de lembranças da pessoa. Às vezes, diz ela, é bom que os enlutados resolvam qualquer pendência com o morto escrevendo-lhe uma carta.
Andrea também prepara os clientes para os “surtos de pesar”, picos súbitos de emoção provocados por aromas, alimentos ou lugares associados à pessoa falecida. Ela diz que, às vezes, “eles acontecem do nada, sem nenhum gatilho óbvio”. E enfatiza que esses surtos são completamente naturais e não devem causar preocupação. “Não estamos tentando mitigar esses sentimentos. Se você estiver no carro, e a música favorita da pessoa tocar, pare e permita-se chorar.” Andrea acrescenta que técnicas de respiração e meditação também ajudam nesses momentos.
Embora aconteçam com menos frequência com o passar do tempo, esses transbordamentos podem nunca desaparecer. “Se você conversar com uma mulher de 80 anos cujo filho morreu 60 anos antes, ela ainda estará de luto”, diz Andrea. “‘O tempo cura tudo’ não é uma verdade absoluta.”
Pesar e luto são palavras frequentemente usadas como sinônimos, mas o Dr. Alan diz que há uma distinção importante entre as duas. O pesar, explica ele, é uma reação pessoal à perda, enquanto o luto “é a reação externa, coletiva, ou o que chamo de ‘pesar tornado público’”. O luto começa com cerimônias como os velórios e os funerais. Por mais difícil que seja, às vezes ver um corpo sem vida ali deitado é a única coisa que torna real o irreal. “Você pode saber em termos intelectuais, mas não emocionais nem espirituais”, diz o Dr. Alan. “E integrar aquela perda desde a cabeça até o coração faz parte do luto.”
Esses eventos também oferecem um contexto para dividir lembranças de quem partiu, validar seu pesar e ter acesso a uma comunidade que impede que nos sintamos isolados. Esse auxílio, diz o Dr. Alan, não deveria terminar aí. “Numa cultura que chamo de animada, não sabemos identificar pessoas que estão de luto”, diz ele, acrescentando que, em consequência disso, é importante buscar apoio constante. Os que procuram grupos podem entrar em contato com clínicas de terapia ou a igreja local e pedir recomendações de grupos de luto.
Para algumas pessoas, com familiares espalhados por muitos países, a distância é um complicador, porque elas estão isoladas das comunidades onde a cura começaria. Viver o pesar sem os amigos que eu tinha em Cingapura me fez dar passos minúsculos sozinho, e nunca pensei em procurar um grupo de apoio nem confiar nos amigos do Canadá que não conheciam Jacob. Quando me recordo, gostaria de ter feito essas coisas. Finalmente, depois de muitos anos, estou pronto para dar esse salto.