Anne Roumanoff fala de sua aflição com a tecnologia, que lota nossa memória com números sobre tudo, inclusive as senhas de que precisamos para tudo.
Redação | 14 de Fevereiro de 2019 às 09:27
Escrevi minha senhapara acessar o banco pela internet num papelzinho que pus na bolsa. Claro que perdi o papelzinho. “Não admira, basta ver o estado de sua bolsa”, disse o homem que amo. Não respondi. Depois de passar anos morando juntos, a gente percebe que não adianta falar quando está irritada, e é assim que os casais acabam não se falando mais.
Cliquei em “Esqueci minha senha”. Os programadores inventaram isso para pessoas como eu, que esquecem tudo. Para provar que você é mesmo você, há perguntas “inesquecíveis” a responder. O problema era que eu não conseguia recordar se a resposta à pergunta “Qual é sua bebida favorita?” era chá, champanhe ou Coca-Cola light. “Você deu três respostas incorretas. Por favor, entre em contato com seu banco” apareceu na tela do computador. Pelo telefone, passei 30 minutos ouvindo “Vamos atender em alguns instantes” até que, afinal, alguém atendeu.
– Perdi minha senha. Não aguento mais.
Minha voz tremia. Mas a atendente continuou calma, para não dizer indiferente:
– Tudo bem. Vou lhe fazer algumas perguntas para confirmar sua identidade.
Fiquei com medo de que ela me interrogasse sobre minha bebida favorita, mas só me pediu o primeiro nome da minha mãe.
– Ah, então é você mesma – disse ela.
– Sim, sou eu. E você é você mesma?
Foi aí que ela fez a pergunta assassina:
– Qual é seu nome de usuário?
– Nome de usuário? Não sei. Perdi a senha.
– Sinto muito. Se a senhora não tem nome de usuário, não posso lhe dar uma senha.
(Anne é uma conhecida humorista francesa, que mora em Paris.)