Sem ninguém saber, a menina guardava seus tesouros em caixinhas, preparando-se para as viagens que sonhava com destino a paisagens distantes.
Claudia Nina | 18 de Julho de 2021 às 10:00
Eram várias pequenas malinhas que levavam para lugar nenhum os imprescindíveis – a pulseira prateada que trocou com a vizinha, que aceitou uma de plástico de volta, as bolinhas de gude que encontrou no chão da pracinha, alguns cacarecos valiosos, umas moedas. Não fazia malas grandes, mas as caixas que poderiam ser carregadas na mão para viagens grandiosas.
As roupas ela não fazia muita questão de guardar. Até porque seus 7 anos eram vestidos com um par de calça quando fazia frio, dois ou três vestidos e um short. Os sapatos eram também poucos, a desculpa por não ter mais de dois ou três no máximo era porque seus pés iam crescer. Então, havia muito pouco para guardar. O mais valioso ia mesmo dentro das caixinhas. Ela adorava esses mini guarda-tudo que ela chamava de “guardatórios”. Tinha o hábito de separar coisas que para os outros não tinha importância, mas para ela eram tesouros. Ela iria levar seus valiosos para o dia em que fosse conhecer o mundão – era assim que descrevia o planeta.
Em uma delas, tinha uma série sobre várias famílias em suas casas e como viviam em países muito diferentes e distantes. Ela se transportava para cada um deles e, com o seu guardatório, mudava-se por um tempo para conhecer suas paisagens. Era um dos passatempos favoritos. Sua imaginação viajante.
Vivia em um mundo tão particular que os pais nem sonhavam em como ela sonhava conhecer lugares novos. Ela gostava da cidade onde nasceu, mas o mundo era tão cheio de acontecimentos e pessoas que ela precisava crescer logo para descobri-los. Aos poucos, percebeu que seus guardados não fariam falta. Descobriu o que poderia ser mais “valioso”, embora a noção de “coisas de valor” fosse muito difícil de entender.
A menina cresceu e continuou sonhando. Demorou um tempo até poder desatracar da proa e seguir seu curso buscando as rotas de paisagens novas. Aprendeu a construir outros guardatórios – aqueles que a emoção, o olhar e a memória nunca esquecem.
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