Os segredos da mulher de 100 anos no meio da rua

A aparente fragilidade pode esconder uma força insuspeitada. Esse era um dos segredos que a velha senhora guardava.

Redação | 22 de Agosto de 2021 às 12:17

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Se alguém não tinha pressa era ela. Não tinha pressa nem pernas para andar além de uma polegada por passo. Andava de mãos dadas com alguém que parecia uma neta de um lado e um pau que funcionava como bengala de outro. Tinha as costas encurvadas, e o rosto quase batia no estômago. Parecia um ponto de interrogação no meio da praça. Ela ia gota a gota, pingando sua existência fininha pela cidade.

Quem a visse de lado ou de costas, era esse o cenário daquela pessoa que deveria ter aproximadamente 100 anos ou perto disso. Alguém frágil, cuja existência na rua dependia de quem a escorasse porque a bengala rudimentar não daria conta, mesmo que ela fosse mínima, e seus passos apenas digitais de um polegar.

Contudo, a mulher guardava segredos.

A praça não sabia. A cidade não sabia. A neta talvez não soubesse e ninguém que passasse apressado por ela na calçada, no asfalto, dentro dos ônibus ou dos carros – muito pouco provável que teriam percebido. Ela atravessava aquela praça diariamente, fazendo o mesmo percurso lentíssimo. A cada dia mais encurvada, mais fina.

A mulher guardava seus segredos muito bem guardados.

Quem percebeu foi, de relance, uma pessoa que cruzou com aquela senhora em uma tarde. Naquele dia, ela estava se sentindo doente. Tinha o joelho destruído por uma operação malfeita e andar era um pequeno sacrifício diário.

No meio da praça, ela se deparou com a senhora de costas. Apressou-se porque, por mais que lhe doessem os joelhos, ela não era tão lenta quanto a outra de 100 anos. Pensou no quanto ela ainda era ágil e jovem! Seu joelho doente não a impediria de avançar para além daquela senhora mínima que lhe atravancava o caminho.

Quando ultrapassou a senhora encurvada, esta levantou o rosto, e seus olhares se cruzaram. A surpresa foi o desvendamento de um segredo. A senhora tinha o olhar que parecia uma lâmina – forte, desafiador, imbatível.

A mulher se assustou porque nunca poderia imaginar tamanha força. Pensou que os olhos estivessem baixos, combalidos, como aquele lento caminhar.

Sentiu-se intimidada por aquele olhar.

Voltou para a casa com a certeza renovada de que nunca se pode julgar ninguém pelas costas… Não precisava consertar apenas seus joelhos, mas também a forma como conduzia os pensamentos.

POR CLAUDIA NINA – claudia.nina@selecoes.com.br

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