Uma escolha errada pode predeterminar uma derrota, se você não estiver pronto para os testes da vida. É o que narra este conto.
Era o grande dia: o teste de vídeo para a vaga na televisão da pequena cidade. O salário era bom, e depois ainda teria chance de ser transferida para uma capital. Nesse caso, juntaria vários sonhos em uma oportunidade só. Antecipou a vitória para se sentir mais fortalecida na decisão de passar pelo martírio de ser testada na frente de vários candidatos.
As mãos começaram a suar, fazia um calor de 90 graus. Ela cismou de escolher um blazer de linho azul porque alguém lhe dissera que o traje tinha que ser clássico. Começou a se sentir outra pessoa dentro da armadura – o linho pinicava, o corte reto e o visual sisudo não eram ela. O teste exigia que as candidatas se apresentassem maquiadas, o que achou um absurdo sem tamanho, mas precisou acatar. Aos 21 anos, não gostava de usar maquiagem, o que significava que a possibilidade de erro era imensa.
Mas acatou. Não poderia se apresentar de rosto nu.
Inventou de usar uma sombra azul para combinar com o blazer. E apostou na base de tom mais escuro que a pele porque o vídeo poderia achá-la branca demais. Ela era de fato branca demais, mas ninguém precisava saber daquela verdade. Escolheu um batom vermelho e jamais soube explicar a si mesma o motivo da desastrada opção.
O estúdio era muito longe, ela foi de ônibus até uma parte do caminho e depois seguiu a pé, no sol de rachar, o que obviamente só fez da maquiagem algo ainda pior.
Chegou finalmente ao local: atrasada, suada, afoita, com o rosto errado.
Quando uma das concorrentes, que tinha sido colega de faculdade, cruzou o olhar maligno na direção dela, com a legenda escrita na testa “que horror”, ela desabou antes de conseguir entrar na sala do teste. A moça havia percebido o quanto ela estava incomodada dentro do blazer e com a máscara de um rosto estranho.
Mesmo que houvesse tempo para uma rápida visita ao espelho, de nada adiantaria. Por dentro ela sabia: perdera a concorrência antes de tentar vencer.
Desistiu. Saiu da sala correndo, sem se despedir de ninguém. Ela sabia do resultado, não precisava fazer o teste para descobrir que falhara.
O aprendizado foi para a vida: não usar máscaras. Se estivesse com o rosto certo na hora do ataque fulminante da concorrente, teria a seu dispor o olhar capaz de desfazer o feitiço.
Por Claudia Nina – [email protected]
Jornalista e escritora – autora, entre outros livros,
de Amor de longe (Editora Ficções)
Quer se emocionar com outras histórias de Claudia Nina? Clique aqui.