A queda solitária na festa para dançar

Na vida, cedo se aprende que um momento de felicidade tão esperado, o ponto alto da festa pode se tornar o momento da sua queda.

Claudia Nina | 7 de Março de 2021 às 10:00

Oleg Elkov/iStock -

Aquelas festas tinham hora certa para acabar, quando de repente as luzes se acendiam do nada e quase não dava para se despedir de ninguém, pois os pais ou as mães já estavam à espera. No meio disso, porém, havia o tempo de liberdade suprema, de luzes coloridas espocando na escuridão, o chão tremendo, iluminado também. A música muito alta gritava no máximo para espantar todos os medos; era um tempo contado no relógio e cada minuto era vivido naquela mesma extensão do som.

A pista de dança era o ponto alto, ao redor do qual tudo girava – os futuros casais, que seriam casais só por uma noite talvez; os olhares de quem buscava alguém e não encontrava nenhum olhar de volta. Mas giravam também na pista os que não queriam nada além de simplesmente dançar. Era o caso da menina, que tinha feito a mãe ir até Copacabana só para comprar a camiseta com brilho, a calça preta justa e a sandália de salto anabela. Achou que a notariam, que, quando entrasse na casa, as pessoas iam parar o que estavam fazendo e olhar para ela. Sonhava coisas assim. Entrou no maior anonimato contrariando todas as expectativas. Expectativas eram plantas espinhosas que tinham que ser cortadas muito antes do crescimento. Bem cedo aprendeu isso.

Não só as expectativas foram contrariadas, como algo pior ocorreu, para mostrar a ela com muita nitidez que não se pode esperar nada de uma noite com hora marcada para acabar.

Ela entrou na pista com euforia. Não quis comer nada, só dançar.

A menina afoita, porém, não se lembrou de ter cuidado ao pisar na noite cheia de expectativas-espinhos. Então, ao lado da colega que também dançava, só que mais calmamente, ela derrapou – a pontinha do salto da sandália nova deslizou em um pedaço de papel de coxinha ou empada. Ela desabou no chão, não sem antes tentar convencer a amiga a cair também, como se fosse um passo ensaiado de dança. A outra negou. Ficou de pé, altiva. E ainda respondeu: “Eu não.”

A menina custou a se levantar porque a sandália escorregava – o tal papel tinha grudado na pontinha do salto. Só conseguiu quando se libertou do papel assassino. Poderia ficar para sempre desmontada naquele chão, porque a vergonha de se levantar e ensaiar uma fuga dali o quanto antes não lhe dava coragem. A colega não ajudou, não estendeu a mão. Ficou onde estava.

Imagem: OSTILL/iStock

Quando se levantou, fingiu que poderia ficar na pista e dançar um pouco mais. Os olhares para ela não deixaram que a vida seguisse normalmente. Ficou o resto da noite em um canto escondido da casa, esperando a hora de o pai vir buscar. Quando o carro chegou, foi um alívio.

A noite inesquecível ensinou, entre várias coisas, que, quando se cai, a queda é sempre solitária…

POR CLAUDIA NINA – claudia.nina@selecoes.com.br

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