Ao mudar de cidade, a garota encontra na pequena livraria perto da casa da avó, o conforto de que precisava naquele mundo sem amigos e cheio de saudades.
Tinha acabado de se mudar para a cidade onde a avó morava. Aquele era antes o lugar das férias, do tempo suspenso entre um ano escolar e outro e nunca tinha sido testado como lugar definitivo.
Não que Luciana pensasse em definitivos. Preferia pensar que os lugares, todos eles, eram passagens e paisagens temporárias. Chegou à cidade da avó com a certeza de que esta jamais seria a “cidade dela” e sim “a cidade da avó” embora o temporário pudesse demorar…
Aos 15 anos, teria que aprender a se distrair. Tudo ao redor seria vasculhado na tentativa de encontrar o que alimentasse a curiosidade e ajudasse a passar os dias eternos que avançavam para além das férias. O ano escolar já tinha começado, não havia ainda amigos que lhe prestassem, tinha saudade de outras paisagens, de outras pessoas que não estavam ali. Queria sempre estar onde não estava – seria este o seu destino?
Um dia, vasculhando a galeria onde ficava o apartamento da avó, Luciana descobriu uma pequena livraria. Não se sabe se ela ficaria na loja um tempo grande não fosse o personagem que virou um amigo breve – o livreiro. Ele era uns dez anos mais velho e tomou para si a tarefa de mostrar à garota um pouco mais do mundo onde vivia imerso e onde ela, dentro de pouco tempo, também iria mergulhar.
O primeiro livro, inesquecível, foi o de Marcelo Rubens Paiva, Feliz ano velho.
A venda era sempre precedida de uma longa conversa sobre a obra, uma espécie de resenha. Luciana levava o livro para a casa da avó, na rápida visita, e desembrulhava ali mesmo, com pressa para ver se o livreiro tinha acertado. Ele sempre acertava. Aquele foi especialíssimo porque marcou um momento novo na vida dela, um recomeço de vida que não era nada festejado, porque ela era uma mistura de tédio e saudade.
Entre um livro e outro, foram vários e vários. Todos lidos, relidos, gostados, guardados na prateleira que começava a se agigantar no quarto dela.
Até que um dia o livreiro amigo a esperava de mãos vazias. Ele não tinha boas notícias. A pequena livraria ia fechar. Ainda bem que teve tempo de se despedir. Não teve foi coragem de agradecer pelas dicas, que lhe ajudaram a alegrar os dias sem rumo.
Durante vários meses, ela passava em frente à livraria na esperança de vê-la ressuscitada, mas a loja estava fechada com uma placa em branco na porta.
Depois de um tempo, ao passar por ali de novo, viu que, no lugar, havia nascido uma loja de calcinhas – 3 por $ 5 reais.
Nunca mais viu o amigo livreiro.
P:S: Se ele ler este texto, quem saiba apareça para dizer olá.
POR CLAUDIA NINA – claudia.nina@selecoes.@rdeditorial