Depois de sobreviver à Guerra do Vietnã, Richard Danzer enfrentou três cânceres. Leia a história completa desse homem que enganou a morte.
Rayane Santos | 5 de Outubro de 2021 às 15:00
Richard Danzer enganou a morte pela primeira vez em 1962. O jovem americano lutava na Guerra do Vietnã e foi encarregado de resgatar um barco encalhado na Ilha de Phú Quôc. Danzer e mais dez soldados tiraram a embarcação da praia, mas, para se salvar das forças norte-vietnamitas, precisaram enfrentar ondas de até 4 metros de altura num bote de borracha.
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Ele achou que não sobreviveria, mas, contra todas as probabilidades, o grupo chegou a seu navio e embarcou. “Desde então, agradeço todo dia a Deus”, diz ele. “E cada dia que vejo o sol é um dia bom.”
Essa atitude ajudou Danzer a se orientar nas águas revoltas da velhice. Hoje, com 79 anos, ele está aposentado em Delray Beach, na Flórida, depois de cinquenta anos de trabalho em vendas e administração no setor de tintas. A mulher tem demência e doença de Parkinson, e ele mesmo tem vários problemas de saúde.
Em 2017, foi diagnosticado com câncer de bexiga. No tratamento da doença, os médicos de Danzer descobriram um carcinoma de células escamosas no nariz. Essa é uma forma comum e agressiva de câncer de pele que parece uma crosta e pode se espalhar para outras partes do corpo se não for tratada. O tumor foi removido e, quando o declararam curado, Danzer passou a fazer consultas regulares para se assegurar de continuar assim. Assim, ele havia conseguido driblar a morte mais uma vez.
No verão de 2018, Danzer notou um carocinho no meio das costas. Não doía, mas, no decorrer de algumas semanas, cresceu tanto que ele não conseguia mais dormir de costas com conforto. Quando falou com o clínico geral, o médico disse que provavelmente era um cisto, talvez uma bolsa benigna de tecido adiposo ou um folículo capilar inflamado – em outras palavras, algo para ficar de olho, mas sem pânico.
O suposto cisto continuou a crescer durante seis meses. Em dezembro, tinha 8 centímetros de largura. E não era tudo. Uma crosta vermelho-escura razoável, parecida com uma casca de ferida, também crescia na perna de Danzer. Ele pediu à filha Cheryl, que fora morar com ele alguns anos antes, que desse uma olhada na perna e nas costas. “Ambos concordamos que era melhor ir ao médico”, diz ele.
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Dessa vez, o médico de família encaminhou Danzer ao dermatologista, que, por sua vez, o mandou a uma especialista na vizinha West Palm Beach para fazer a cirurgia de Mohs e remover as células cancerosas da pele. Danzer pediu à nova dermatologista, Brittany Smirnov, que também olhasse o caroço nas costas.
Imediatamente, ela teve certeza de que não era um cisto. Não havia o furinho típico dos cistos causados por folículos problemáticos. E o caroço era firme, como uma borracha de apagar, enquanto os cistos geralmente são moles e gelatinosos, como pudim dentro de uma bola de encher. O caroço também não tinha cheiro ruim, outro sinal revelador dos cistos formados sob a pele pelo acúmulo de fluido lubrificador dos pelos. Além disso, tinha crescido mais depressa do que qualquer cisto.
Depois de descartar esse diagnóstico, Smirnov achou que poderia ser um lipoma, um acúmulo de gordura comum e benigno. Ela empurrou o caroço entre os dedos – os lipomas se movem facilmente sob a pele com uma leve pressão –, mas o caroço não se mexeu. Parecia fixado na parte posterior da caixa torácica de Danzer.
Ainda sem entender, Smirnov fez perguntas a Danzer sobre sua saúde geral. Tinha emagrecido? Não, respondeu ele. Havia algum problema novo? Nada de novo, mas ele tinha uma tosse seca e crônica que atribuía a fumar um maço de cigarros por dia durante mais de quarenta anos. Essa descoberta ligou o interruptor do cérebro de Smirnov. Às vezes, anormalidades da pele indicam câncer de pulmão, um diagnóstico plausível para um fumante de longa data como Danzer.
“Uma das áreas onde os cânceres de pulmão adoram criar metástase é na parede do tórax”, diz Smirnov.
Ela pediu uma tomografia computadorizada espiral do pulmão de Danzer. O resultado confirmou sua suspeita: ele estava com câncer de pulmão em estágio quatro, e células cancerosas tinham ido do pulmão para o tumor nas costas. A probabilidade, concluiu a equipe médica, era de que Danzer tivesse apenas 18 meses de vida.
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“Foi um choque. Não consegui entender na hora”, diz ele. Então, quando a notícia começou a se instalar, ele deixou “tudo nas mãos de Deus”.
Havia uma pequena probabilidade de que, com o tratamento certo, Danzer conseguisse enganar a morte outra vez. Ele fez quimioterapia e cinco séries de tratamento com CyberKnife, um braço robótico que atinge o tumor com rajadas concentradas de radiação. Quase imediatamente, o caroço nas costas de Danzer mostrou uma redução.
“Quando o tumor das costas começou a encolher, soubemos que o tumor interno também estava encolhendo”, diz Smirnov. “Foi um ótimo barômetro para nos dizer que o câncer reagia ao tratamento.”
Em dois meses, o caroço sumiu, deixando apenas uma ferida na pele; com uma solução tópica, ela se curou em poucos dias. A quimioterapia durou vários meses, e nesse tempo Danzer se sentiu enjoado e sem energia. A filha o alimentou, consolou e cuidou dele. “Não sei onde eu estaria sem ela”, diz ele.
Cerca de um ano depois da primeira consulta de Danzer com Smirnov, ele foi considerado outra vez livre do câncer. Havia enganado a morte novamente. No verão de 2020, estação que supostamente não viveria para ver, ele voltou a gozar sua aposentadoria e a passar seu tempo com a filha, aliviado por estar vivo e grato a Smirnov por ter lhe salvado a vida.
“Já ultrapassei minha data de validade em um ano e meio”, diz ele. “Eu achava que, depois do Vietnã, já estava vivendo no lucro. Essa foi mais uma bênção.”
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