No Canadá, assim como no Brasil e em outros países em todo mundo, as fake news vêm ganhando espaço e trazendo muita desinformação. Saiba como reconhecê-las.
Raquel Zampil | 20 de Janeiro de 2020 às 22:46
Em novembro de 2014, Yaman Abuibaid e Daré Adebanjo, dois adolescentes canadenses, experts em computadores, queriam ganhar um dinheiro rápido. Impressionados com o fato de os amigos terem caído em uma história satírica sobre Kim Kardashian, decidiram lançar o próprio site de fraudes. Então criaram o “Hot Global News” (Notícias quentes globais) e ficaram à espera dos dólares da publicidade. Num primeiro momento, o projeto arrecadou apenas dinheiro miúdo, mas depois de um ano, a dupla descobriu o ouro.
Durante e após a campanha da eleição federal canadense de 2015, eles publicaram várias histórias satíricas sobre o vencedor: Trudeau proibindo Trump de entrar no Canadá, Trudeau apoiando o ISIS, Trudeau distribuindo maconha no Halloween. As histórias foram compartilhadas dezenas de milhares de vezes nas redes sociais, provocando tanto apoio quanto ultraje.
“Justin Trudeau mais qualquer coisa ligada a maconha foi a melhor fórmula para eles”, diz Craig Silverman, editor de mídia da BuzzFeed News. Foi ele quem descobriu a história sobre o projeto falso dos adolescentes. Antes de serem desmascarados, o site era lucrativo – arrecadou mais de 10 mil dólares em receita de publicidade só em outubro de 2015.
Quando o Dicionário Oxford declarou que a palavra do ano de 2016 era “post-truth” (pós-verdade), é provável que eles não tivessem em mente empresários ainda no ensino médio. Mas a desinformação digital – seja de garotos travessos ou de propaganda política maliciosa – está crescendo. Ainda bem que, quando se trata de avaliar as notícias, há alguns modos simples de se separar os fatos da ficção.
Antes da Internet, as pessoas regularmente procuravam, e confiavam, em seu jornal ou sua estação de rádio favoritos para se informarem. Hoje, de acordo com uma pesquisa de janeiro de 2018 feita pelo Centro de Pesquisas Pew, 42% dos canadenses usam mídias sociais – Facebook, Twitter e até Instagram – pelo menos uma vez ao dia para ter acesso a notícias. “Agora a informação chega de tantas fontes diferentes que você precisa assumir a responsabilidade sobre o que você está vendo”, afirma Silverman. “Não pode simplesmente supor que tudo que lê é verdade.”
Ele recomenda que se confie em várias fontes, e não só em uma, mas que as investigue primeiro. “Veículos confiáveis contam a você sobre eles próprios – as pessoas envolvidas, onde estão baseados, sua missão”, observa Silverman. “A falta de informação é definitivamente sinal de alerta.” Quando você encontrar um website desconhecido, ele sugere procurar uma página “Sobre” e examinar a página em busca de manchetes estranhas. Procurar o nome do veículo no Google vai permitir que você veja se outras fontes, como a Wikipedia, a divulgam como sátira ou informação falsa.
Jessica Johnston, do CIVIX Canadá, um fundo de caridade com engajamento cívico que recentemente lançou um projeto piloto de noticiário para alunos, diz que você também pode levar em conta a história do canal e o tamanho da audiência. Por exemplo, um webcast com apenas cem assinantes deve ser abordado com mais cautela do que um canal de televisão com 20 anos e milhões de espectadores.
As fake news se alastram quase exclusivamente pelas redes sociais, de acordo com Gordon Pennycook, professor da Universidade de Regina. Ele estudou o fenômeno em Yale e adverte: “Se você estiver procurando notícias no Facebook, deve lidar com elas de um modo mais crítico.”
Pennycook sugere verificar a URL do canal. Se não tiver sido postada diretamente da fonte, leve em conta quem está compartilhando: um parente bem informado ou um amigo que regularmente veicula visões extremas? E não leia apenas a chamada. De acordo com uma pesquisa da Universidade de Columbia e do Instituto Nacional Francês, cerca de 59% dos links circulados no Twitter nunca são abertos. Às vezes nem mesmo por aqueles que os compartilham. Apenas ao clicar você pode detectar se a manchete é precisa e atual.
Por exemplo, você teria de fazer uma pesquisa considerável para perceber que uma frase que circulou nas mídias sociais durante a campanha de Trudeau em 2015 – “Eu não leio jornais. Eu não assisto ao noticiário” – na verdade era de 2001. A fotos também podem ser igualmente mal utilizadas. A foto de um sacerdote muçulmano de Mississauga acompanhou uma história falsa sobre um mosteiro no Texas que se recusava a ajudar não muçulmanos depois do Furacão Harvey. Silverman sugere que um jeito infalível de reconhecer uma foto falsa é usar a função do Google de pequisa reversa da imagem, que irá revelar exatamente onde (e quando) a foto foi originada.
Se nenhuma das estratégias acima o ajudar a verificar uma notícia, Pennycook recomenda procurar por ela em recursos on-line, como boatos.org, apublica.org, e-farsas.org, projetocomprova.com.br e outros. “Muitas vezes, histórias falsas já foram verificadas por alguém.”
As fake news são projetadas para se tornarem virais, com o objetivo de receber cliques, vender anúncios ou propagar uma ideologia. E não têm limite para atingir a sua meta – elas podem ser tão bizarras e incendiárias quanto quiserem. Alguns relatórios que se seguiram ao ataque a uma van em Toronto em abril de 2018, por exemplo, identificavam incorretamente o motorista como jihadista.
“Essas histórias tiram proveito da emoção, usando linguagem bastante carregada”, diz Jessica Johnston, acrescentando que as fake news sempre buscam o choque, o ultraje ou a alegria intensa. “Sabemos que quando você sente algo, isso faz com que queira compartilhar. É um impulso humano.” A sugestão dela: “Se você ficar empolgado para compartilhar logo alguma coisa, essa é exatamente a hora em que você deve parar e se perguntar: ‘Isso está correto?’”
Se você vir um amigo ou parente compartilhando informação falsa, Silverman recomenda que fale com ele off-line, de forma a não confrontá-lo. “Desmentir alguém em uma postagem no Facebook não vai mudar o comportamento dele”, dizele. “O efeito vai ser completamente contrário.”
Em vez de adverti-lo ou ridicularizá-lo, sugere diz, seja simpático. “Cada pessoa – não importa a idade, o nível de inteligência, as convicções políticas ou onde vive – está lutando nesse confuso e caótico ambiente de comunicação. As pessoas não devem se sentir envergonhadas se caírem e acreditarem em uma história falsa”, diz ele. “Mas, se todos nós fizermos aquela breve pausa extra, seremos capazes de impedir que essas coisas falsas se alastrem.”
Por Luc Rinaldi