A literatura de cordel é uma das expressões populares mais significativas do Brasil. Conheça a história e os principais autores dessa arte.
A literatura de cordel é uma das expressões artísticas mais famosas da cultura nordestina. Mas você sabe o que é cordel? Trata-se de um gênero literário que utiliza poesias rimadas impressas em pequenos e simples folhetos. O cunho artesanal deste veículo literário faz com que existam muitos cordelistas, de diversas classes sociais.
Os textos geralmente discorrem sobre temas relacionados ao próprio Nordeste, suas paisagens, figuras populares e personagens do dia a dia. Existem cordéis sobre amores, histórias de vingança, histórias épicas e até o cordel infantil. O nome cordel vem das cordas onde os livretos eram, e ainda são, expostos nas feiras.
Em 2018, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN declarou que a arte do cordel é um Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro, pelo seu imenso valor e contribuição à cultura brasileira.
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A origem do cordel
Se formos buscar na história da literatura, o berço do cordel é ainda no Renascimento. Com o advento de tecnologias que permitiam a impressão de palavras, os textos entoados por trovadores passaram a ganhar a sua versão física, por meio de pequenos livros. E com a colonização do Brasil por Portugal, essa tradição europeia ganhou espaço por aqui, ainda no século XVIII.
Mas data do século XIX o verdadeiro início da produção de cordéis brasileiros. Esses já falavam de temas do país, tendo como ponto de partida a perspectiva do cordelista sobre o Brasil e seus acontecimentos sociais e cotidianos. Este modo de fazer literatura ganhou força principalmente nos estados da região Nordeste, embora a produção tenha se difundido para o restante do Brasil.
Características da literatura de cordel
O cordel é uma forma muito acessível de literatura, pois seus materiais são de baixo custo. Se você se pergunta como fazer um cordel, é preciso conhecer algumas características básicas dele.
O cordel é uma forma de poesia popular bastante singular, que preza pelo uso de rimas para o desenrolar da narrativa, a qual traz musicalidade para o texto. A oralidade é uma grande aliada também, já que, além de os textos serem fáceis de serem recitados, muitos deles existem anteriormente, quando eram apenas falados. É um processo diferente da poesia tradicional, em que, na maior parte das vezes, a escrita é o meio inicial da obra.
Ainda falando sobre a produção dos poemas, a rima não é o único artifício usado pelos cordelistas. A métrica também é algo que se faz necessário para criar a dimensão musical dos textos. A metragem mais usada atualmente é a sextilha, quando cada estrofe do texto é composta por seis versos.
Cada cordel contém uma só história, ou seja, durante a leitura de um livreto, você acompanhará o início, o desenrolar e a conclusão de uma só narrativa.
Livretos ilustrados
Tratando-se dos livretos em si, eles são feitos em tamanhos pequenos desde sempre. Fáceis de carregar e expor para a venda, geralmente cabem no bolso, e o número de páginas varia de acordo com a quantidade de texto produzido. Os menores têm cerca de 8 páginas, mas cordéis mais extensos podem ter mais de 60 delas.
Para ilustrar as histórias, muitos cordéis contam com xilogravuras que representam as personagens e cenários mencionados ao longo do texto. É uma técnica em que se talha o desenho numa madeira e depois a usa como se fosse um carimbo, molhando na tinta e marcando alguma superfície. Essa também é uma herança dos portugueses.
Alguns cordéis e cordelistas famosos
Leandro Gomes de Barros
Talvez seja um dos poetas mais aclamados da arte do cordel. Tanto que a data do seu nascimento, 19 de novembro, foi escolhida para ser o Dia do Cordelista. Ele é considerado o primeiro autor de cordéis no Brasil e publicou mais de 200 deles. Alguns de seus títulos inspiraram o escritor Ariano Suassuna na realização de “Auto da Compadecida”.
João Martins de Athayde
Depois da morte de Leandro Gomes de Barros, João Martins comprou os direitos de toda a sua obra literária. Durante muito tempo, ele usou seu próprio nome em textos de autoria de Leandro. Mas ele também foi escritor de seus próprios versos e faz parte do grupo que iniciou a tradição de impressão de cordel no país.
Apolônio Alves dos Santos
Cordelista paraibano, escreveu títulos como “Maria cara de mau e o príncipe gregoriano”, “Epitácio e Marina” e “O pau de arara valente”. Para se sustentar, trabalhava como pedreiro, e, em 1960, viajou para ser empregado na construção de Brasília, onde escreveu “A construção de Brasília e sua inauguração”, que se esgotou rapidamente.
Cego Aderaldo
Os versos de Cego Aderaldo são de relevância até hoje. Isso pela força dos textos e pelo jeito de ele recitá-los. É chamado de cantador, por sempre unir a poesia com a música na tradição de repentistas ou violeiros.
Maria das Neves Baptista Pimentel
Foi a primeira mulher da literatura de cordel no Brasil. Em 1938, ela publicou “O violino do diabo ou o valor da honestidade”, usando um pseudônimo masculino, justamente pela falta de autoras femininas na cena literária.
Jarid Arraes
Atualmente, Jarid Arraes tem feito um trabalho de resgate do cordel. Usando desse meio para falar de temas importantes como o machismo e o racismo, ela é autora do livro “Heroínas negras brasileiras: em 15 cordéis”.
A literatura de cordel na cultura
O universo da literatura de cordel transbordou as páginas dos livretos.
Como já mencionado, Ariano Suassuna se inspirou na tradição cordelista para escrever um de seus maiores clássicos, a peça “Auto da Compadecida”. A obra ficou nacionalmente famosa depois de ganhar uma versão audiovisual, estrelada por Selton Mello, Matheus Nachtergaele e Fernanda Montenegro.
Em 2011, a novela “Cordel encantado” fez enorme sucesso ao usar elementos dos cordéis para ajudar a contar a saga de suas personagens. A abertura era uma animação na qual as xilogravuras presentes nos livretos interagiam entre si.
Atualmente, atrelado à produção de literatura moderna, o cordel tem encontrado meios de se reinventar. Alguns artistas lançam obras que misturam história em quadrinhos com elementos típicos dos cordéis, por exemplo. Além disso, escritores do cordel tradicional ainda produzem e ajudam a manter o legado dessa expressão artística.