Ave pode voltar para a natureza, mas cientistas alertam para riscos caso isto ocorra.
A empresa de biotecnologia Colossal Biosciensces anunciou, em janeiro, seu mais novo experimento: reviver a espécie dos pássaros dodôs, extinta há mais de 350 anos. Com altos financiamentos e tecnologia avançada para genética, a startup se prepara para a reinserção das aves na natureza. No entanto, cientistas alertam para as consequências desse processo.
Como eles pretendem trazer o dodô de volta à vida?
Trazer o dodô (Raphus cucullatus) de volta à vida não seria possível se não fosse o sequenciamento do genoma feito por cientistas da Universidade da Califórnia, em 2022, a partir de fósseis preservados em um museu na Dinamarca.
A Colossal pretende juntar essa amostra de DNA do dodô com a de seu parente vivo mais próximo – no caso, o pombo-de-nicobar (Caloenas nicobarica) – num processo de modificação para se criar uma ave intermediária. Além disso, serão utilizados dados de outro parente genético próximo, o solitário-de-rodrigues (Pezophaps solitaria), também extinto.
Ao final, será feita uma transferência de linhagem germinativa com os dados genéticos coletados, utilizando um hospedeiro de frango substituto como uma ”barriga de aluguel” para preparo da última etapa: a incubação do ovo. Assim, um novo conjunto de genomas pode ser modelado, criando uma nova população de pássaros dodôs.
Os dodôs
Extintos entre 1662 a 1690, os dodôs foram uma espécie de aves um tanto curiosa. Tinham, em média, um metro de altura e pesavam em torno de 23 quilos. Habitavam apenas a região das Ilhas Maurício, localizada ao lado de Madagascar, no Oceano Índico. Como eram os únicos no arquipélago, não haviam predadores para a espécie.
Assim, desenvolveram características para um estilo de vida terrestre. Sua cabeça diminuiu e o bico se tornou longo e curvo, facilitando o acesso à comida no chão, como frutas caídas e raízes. As asas também se modificaram, pararam de crescer, mantendo uma envergadura entre 56 e 66 centímetros. A baixa estrutura e o peso das asas contribuíram para que os dodôs não tivessem mais a habilidade de vôo. Mesmo assim, desenvolveram alta mobilidade e agilidade no solo.
Com a chegada dos colonizadores nas ilhas, o dodô se tornou um alvo frágil. Os marinheiros europeus se alimentavam das aves e levaram para seu ambiente outros animais, até então desconhecidos pelos dodôs, como gatos, porcos e ratos. Essa desestabilização do habitat natural culminou na extinção da espécie.
O que dizem os especialistas sobre o experimento?
Para a Colossal Biosciences, trazer de volta espécies já extintas será um marco importante para a preservação do meio ambiente, como uma reconciliação com o que exterminamos.
”Nunca houve tanta urgência em preservar as espécies quanto hoje. Não é importante apenas para a continuidade de sua existência, mas também para o bem maior do planeta. Juntos, a Colossal e a comunidade científica em geral estão comprometidos com nossos esforços para extinguir aqueles que perdemos”, afirmou Beth Shapiro, pesquisadora e professora de Biologia Evolutiva na Universidade da Califórnia.
Porém, há quem alerte para as consequências do experimento. Em entrevista para a Newsweek, Euan Ritchie, professor de ecologia e conservação da vida selvagem na Universidade Deakin, questionou se ressuscitar uma espécie já extinta poderia, de fato, mantê-la viva.
”Não sabemos quanto tempo os indivíduos das espécies ressuscitadas viverão, mas parece provável que eles enfrentem muitos desafios significativos, entre os quais a perda potencial de comportamentos naturais (caça, fuga de predadores...) que promovem a sobrevivência”, afirmou Ritchie.
Leia também: Veterinários trabalham para evitar extinção de gorilas-das-montanhas
Outros questionamentos da comunidade científica envolvem os gastos para tamanho experimento com propósitos ainda não tão claros. Apenas o projeto de pesquisa já conta com 150 milhões de dólares investidos. Para Jason Gilchrist, ecologista da Universidade Napier de Edimburgo, esse investimento poderia ser melhor aproveitado.
”A ressurreição requer enormes quantias de dinheiro e investimento em conhecimento e tecnologia, com uma probabilidade relativamente baixa de sucesso. Sinto que devemos nos concentrar em salvar a biodiversidade que ainda temos (na qual não estamos fazendo um bom trabalho) em vez de investir em projetos para trazer de volta espécies que já falhamos”, disse Gilchrist.