Tosquiar lhamas, mergulhar atrás de bolas de golfe, criar arte com Lego... Eis 5 relatos de pessoas que têm profissões fora do comum!
Rayane Santos | 22 de Novembro de 2021 às 11:00
Tosquiar lhamas, mergulhar atrás de bolas de golfe, criar arte com Lego… Acredite ou não, todas essas atividades são nada mais, nada menos que profissões. Aposto que ao pensar em empregos, vem logo à sua cabeça advogado, médico, policial e alguns outros. Contudo, pelo mundo afora existem muitas profissões inusitadas. Eis 5 relatos de pessoas que têm modos muito incomuns de ganhar a vida!
O som dos cincerros é sinônimo dos Alpes bávaros, tanto quanto a cerveja e a calça curta tirolesa. Mas esses sinos têm um propósito sério: eles ajudam pastores a saber onde estão suas vacas quando a visibilidade é ruim e até a reconhecer cada uma delas, porque cada cincerro tem um som específico.
Os sinos são feitos por um pequeno número de fábricas da região de Oberallgäu, inclusive a forja da família de Gerhard Bertele, em Bihlerdorf. A empresa foi fundada por seu bisavô em 1912 e fazia todo tipo de peça de metal; por volta de 1980, os cincerros passaram a fazer parte da produção.
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“Tive a ideia na época do chamado Klausentreiben, um costume da região alpina em dezembro para expulsar demônios”, explica Gerhard. “Rapazes correm pela rua vestidos com peles de animais, com grandes cincerros amarrados na cintura. Achei que seria bom produzir os sinos durante o inverno, quando temos menos serviço. Nós os fabricamos para criadores de toda a região.”
Forjar manualmente cada cincerro leva de 2 a 8 horas. Duas folhas de ferro são aquecidas até amolecerem e depois marteladas até adquirir um formato semicircular. Para fazer um único cincerro de tamanho médio, que pesa cerca de 2,5 quilos e tem 45 centímetros de largura, são necessários mais de 25 mil golpes. O badalo é acrescentado, e as duas metades são unidas e revestidas com um verniz transparente para evitar ferrugem.
“É preciso ter boa forma física, mas, além de força e resistência, também é essencial ter bom ouvido e olhos argutos”, diz Gerhard, que emprega três operários especializados e dois aprendizes. Os fabricantes de cincerros podem ser identificados pelo formato de seu produto, que varia de redondo a oval e ao formato de xícara (que é o preferido de Gerhard).
Fazer cincerros traz muita satisfação, acrescenta ele: “O trabalho envolve várias habilidades, e sentimos orgulho quando finalmente seguramos o sino pronto. Também estamos mantendo uma tradição, o que é importante. A natureza alpina tem de ser preservada. O gado que pasta na montanha ajuda a proteger o meio ambiente; a seu modo, os cincerros também contribuem.
Aimée Whyte viu coisas terríveis em sua vida profissional. Mãos e pés aleijados. Membros quase mutilados. Às vezes, faltava o rosto todo.
“Nove em cada dez vezes, a causa foi um cachorro enciumado, e parece que eles sempre atacam o rosto”, diz ela com objetividade. “Recebemos muitos desses.”
Felizmente, não houve derramamento de sangue nesses acidentes pavorosos, porque Aimée é um dos cinco cirurgiões de ursos de pelúcia do Leith Toy Hospital de Edimburgo, na Escócia, onde bonecas e animais de pelúcia são consertados e reformados. E nenhum caso é terminal.
O “hospital” recebe cerca de dez pacientes de pelúcia por semana, e cada um deles tem ficha própria e é chamado pelo nome. Os tipos de lesão são muitos e variados, diz Aimée, e não há dois dias iguais no emprego.
“Muitos bichinhos mais velhos precisam de remendos, porque o tecido está muito desgastado, e quando há muita degradação temos de recobri-los completamente”, explica ela. “Não é incomum ter de desmontá-los para consertar as articulações. Também recebemos muitos coalas trazidos da Austrália com mãozinhas de plástico, e às vezes temos de refazê-las.”
Aimée trabalha no hospital desde sua fundação, em 2019. Estudou figurino na universidade e tinha acabado de completar o trabalho numa peça em Glasgow quando começou.
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“Eu só trabalharia naquele dia para ajudar, mas acabei não saindo mais”, diz ela. “Quando me perguntam o que faço, tenho que explicar. Muita gente não percebe que é um emprego de verdade.”
E é um emprego importantíssimo para os preocupados donos de ursinhos de pelúcia que levam os pacientes até Aimée. “Normalmente, são adultos”, diz ela. “Para eles, não é só um brinquedo, é um companheiro especial. Em geral, foi uma constante em sua vida: cresceram com ele, saíram da casa dos pais com ele. Assim, quando o pegam de volta, sempre há lágrimas.
Quando Patrick Schönemann tinha 9 anos, seu pai começou a jogar golfe e lhe deu um taco pequeno para que o filho pudesse ir junto. Mas o jovem Patrick não se interessou muito pelo esporte. “Eu achava mais divertido procurar as bolas no bosque”, diz ele com uma risada.
Não demorou para a caça às bolas de golfe se tornar uma paixão, e todo fim de semana ele ia de bicicleta ao clube de Gotemburgo, na Suécia, sua cidade natal, para vender por alguns trocados aos jogadores as bolas que achava. Dali a algum tempo, ele ampliou a área de busca aos lagos do campo de golfe, e vadeava a água rasa, tateando com os pés para achar as bolas. Mas o tesouro de bolas de golfe nas profundezas dos lagos continuava fora do alcance – até que ele fez 18 anos, tirou licença de mergulhador e comprou equipamento de mergulho.
Durante muitos anos, mergulhar atrás de bolas era algo que Patrick fazia nas horas vagas para ganhar um dinheirinho. Só quando a empresa que fundou não foi em frente ele viu na atividade uma possível carreira.
Com um amigo, Patrick abriu sua própria empresa de mergulho para recuperar bolas de golfe, a Golfballdivers.se.
Isso foi cinco anos atrás, e hoje ele e sua equipe recuperam bolas perdidas em campos de golfe de toda a Escandinávia e também da Alemanha, da Suíça e da Polônia, indo de Estocolmo até lá de carro.
“O número de bolas que encontramos varia de quinhentas a duas mil em cada lago”, diz ele. Os mergulhadores vestem o equipamento e as pegam à mão. “O lago é completamente escuro, e é preciso tatear para encontrá-las.”
Mas não é tudo o que encontram. Além de tacos descartados, Patrick já recuperou celulares, um par de patins de gelo, uma frigideira e até uma caixa registradora.
As bolas são vendidas a varejistas on-line. “Ganhamos dinheiro, mas temos de trabalhar duro”, diz ele. “Eu gosto. Cada dia é novo: um campo de golfe diferente, um lago diferente. Mas, se me perguntar em dezembro, quando faz dois graus e está nevando, talvez eu lhe dê outra resposta!”
O sétimo aniversário da filha de Dirk Denoyelle mudou sua vida. “Ela ganhou sua primeira caixa de Lego”, recorda ele. “Tive Lego quando menino, mas aí fui para a faculdade, me formei, conheci minha mulher, essas coisas. Tinha esquecido tudo sobre as pecinhas. De repente, elas voltaram a aparecer. Comecei a brincar com elas e, dali a algum tempo, pensei: parece que sou muito bom nisso…”
Na época, Dirk era um comediante de sucesso em sua Bélgica natal, e as pecinhas lhe deram uma ideia: “Há um artista local aqui, que é cantor e escultor, chamado Willem Vermandere, meu personagem há tempos. Pensei: por que não construir sua cabeça com Lego?” Foi o que ele fez, e mostrou no palco o “autorretrato” feito com a nova técnica de escultura chamada “cubismo digitalista”. “Para minha surpresa, o público adorou!”
A semente estava lançada. Dirk, que mora em Antuérpia, continuou fazendo cabeças de celebridades em tamanho natural para suas apresentações: muitos personagens de comédia, como o Gordo e o Magro, Mr. Bean e John Cleese, assim como celebridades belgas e até um superastro de Hollywood; ele se orgulha bastante de seu George Clooney.
“Em geral, após uma ou duas horas eu enjoo e me canso da concentração, aí vou fazer outra coisa.”
Depois de fazer cerca de 25 cabeças, ele se apresentou em um espetáculo na Lego Holland e conheceu um executivo da sede de Billund, na Dinamarca. Não demorou para que se tornasse o sétimo “Profissional Autorizado Lego” do mundo. O título não significa que ele trabalhe para a Lego, mas que tem acesso mais fácil às pecinhas.
Aos poucos, a arte com Lego de Dirk obscureceu seu trabalho como comediante, embora às vezes ele ainda se apresente. Ele tem uma pequena empresa, a Amazings, que faz obras de arte originais com Lego para exposições e museus. Além dos bustos tridimensionais, Dirk também cria extraordinários mosaicos bidimensionais com Lego. Seu favorito é uma adaptação de 5 por 3,6 metros da Adoração dos Magos, de Rubens, com Einstein, Gandhi, Martin Luther King e Amaya, esposa de Dirk.
E ele adora o trabalho. “É maravilhoso transformar passatempo em profissão”, diz ele. “Para mim, a vida é diversão, fama e fortuna – nesta ordem.
Eve Kastner gosta de animais incomuns. Em casa, na região da Dordonha, na França, ela cria miniburros americanos e “minimulas”. Mas ela também tem outro emprego como tosquiadora de lhamas e de suas primas menores, as alpacas.
Tudo começou em 2015, quando a família de Eve resolveu dar ao pai dela duas alpacas de presente em seu 50º aniversário. Como as ovelhas, as lhamas e alpacas não trocam de pelo, ou seja, precisam ser tosquiadas todo ano. “Senão, podem morrer nos períodos de muito calor”, diz Eve.
As moscas também põem ovos na lã dos animais, e aí as larvas penetram na pele.
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Quando viu as alpacas do pai serem tosquiadas, Eve teve a ideia de fazer isso pessoalmente, e o tosquiador se ofereceu para lhe ensinar. Hoje, ela viaja para visitar mais de 100 clientes espalhados pelo país; ano passado, tosquiou cerca de 400 animais.
Para a tosquia, os animais têm de ficar presos ao chão durante uns vinte minutos. Isso pode ser estressante para eles, admite Eve, mas é a única maneira de tosquiá-los com segurança. “Para acalmá-los, converso com eles ou peço ao dono que converse”, diz ela. “Em geral, dá certo.”
Ela acrescenta que “é um serviço braçal e cansativo. Nunca me machuquei gravemente, mas sempre há o risco, porque esses animais podem ser muito agitados e lutar. É fácil ser chutado. Ao mesmo tempo, é necessário se concentrar bastante durante a tosquia, porque é fácil machucá-los com a tesoura se os movimentos não forem precisos e controlados”
Eve diz que, quando fala sobre seu trabalho, todos se surpreendem com o fato de haver tantas lhamas e alpacas na França. E ela aconselha: não irrite uma lhama ou alpaca.
“Quando se aborrecem, elas cospem na gente. São verdadeiras submetralhadoras”, diz ela com uma risada. “Certo dia, me esqueci de fechar a janela do carro, e uma alpaca cuspiu lá dentro com toda a força. Sujou tudo e ficou fedendo muito. Une horreur! Mas amo esses animais. Na maior parte do tempo, são muito pacíficos e elegantes.”