Entrevista com Paulo Betti sobre o filme "A fera na selva".
Redação | 10 de Novembro de 2017 às 01:51
O ator Paulo Betti faz um convite irresistível: leia o livro, veja o filme e aprenda a fazer cinema
Com uma invejável carreira de 42 anos, 60 seriados e novelas e 32 filmes, Paulo Betti já sentiu diversas vezes a emoção da estreia. Mas, com seu novo filme, A fera na selva, essa sensação tem um sabor especial, multiplicado, coletivo. Em tempos difíceis para a cultura no Brasil, o ator de 65 anos, que já deu vida a personagens marcantes no cinema como o capitão Lamarca e o detetive Ed Mort, sentiu a necessidade de criar uma estratégia inovadora para viabilizar seu projeto: transformar o público em um participante ativo do processo cinematográfico. Seleções conversou com o artista sobre essa empreitada que une arte e educação e sobre a principal temática abordada no filme: a dificuldade que muitos de nós têm de viver o momento presente de maneira integral, sem ansiedade.
Encenamos uma adaptação dessa novela do escritor americano Henry James nos anos 1990. Desde então, eu e Eliane Giardini (ex-mulher do ator e apaixonada pelo texto) acalentávamos o desejo de transpor a obra literária para o cinema. Há cerca de dois anos, depois de um longo processo de captação de recursos e de diversos tratamentos do roteiro, finalmente conseguimos.
João é um homem assombrado pela expectativa de que algo extraordinário vai acontecer na sua vida. Ele não consegue viver o momento presente, está sempre à espera de alguma coisa. E acaba não percebendo as sutilezas dos momentos, pequenas alegrias, um grande amor… Esse
parece ser um desafio da atualidade. De todos nós.
Filmamos em Sorocaba, cidade onde eu nasci, e, quando vi reunida a equipe de excelentes profissionais – diretores, fotógrafos, maquiadores, cenografistas –, me senti no dever de compartilhar a experiência com a comunidade. Espalhei a notícia de que quem quisesse poderia participar do filme, fosse como figurante ou simplesmente se aproximando dos profissionais para aprender a fazer cinema. Mas com uma condição: todos deveriam ler o livro.
As pessoas se envolveram de uma maneira muito positiva. Disponibilizei o roteiro adaptado para que lessem também e convoquei todos para um cineclube, onde seriam exibidos dez filmes que eram referência para o nosso. Certa vez, depois da exibição de Limite, do Mário Peixoto, que é um filme difícil, em preto e branco, um menino de 12 anos nos contou que tinha lido o livro A fera na selva, tinha lido o nosso roteiro e ainda sugeriu uma mudança no final. Que eu acatei!
Sim. Percebi que seria enriquecedor fazer um tipo de lançamento educativo do filme, convidando as pessoas a experimentarem esse processo transmídia, que vai da linguagem literária, passa pela literatura para o audiovisual, que é o roteiro, e termina no audiovisual pronto, o filme. Além disso, queremos promover cursos a distância com os profissionais do filme. Temos cenas extras que não entraram na versão final, gravações da peça encenada há 30 anos, o texto teatral digitalizado… Bastante material para ilustrar todo o processo.
Aproveito as apresentações da minha peça Autobiografia autorizada, em turnê pelo país, para conversar com o público sobre o filme e fazer uma lista de e-mails das pessoas interessadas. Temos cerca de 5 mil e-mails, já. Outro dia fui a Belém exclusivamente para falar sobre o filme com um grupo. E não é só no Brasil que há pessoas entusiasmadas pelo projeto – tem gente lendo o livro em Portugal, em Israel…
Fiquei bem satisfeito com o que ouvi do público. Esse é um filme “fora da curva”. Sua linguagem tem um tom teatral, expressionista. Eliane e eu recebemos o Troféu Especial do Júri pela contribuição à arte dramática no teatro, na TV e no cinema.
Faremos lançamentos em sessões fechadas, em cineclubes, primeiro para os inscritos no projeto, praça por praça. Este não é um filme para circuito comercial. Tenho consciência da dificuldade de se alcançar bilheteria. Ainda mais com a atual situação do país.
Esse projeto está na origem do filme. De ser um processo permeado pela opinião crítica de quem participa dele. Por que não estimular a leitura de um livro clássico e formar uma rede de espectadores com uma compreensão mais aprofundada do filme? É também uma questão de necessidade e sobrevivência. Gostaria que meu filme cumprisse a sua missão, que é ser visto pelo maior número de pessoas. E o projeto educativo ajuda nesse sentido. Como disse Guimarães Rosa, “o sapo não pula por boniteza, mas porém por precisão”.
Para participar do projeto de lançamento educativo do filme A fera na selva, acesse: migre.me/ws3K7 e o site www.aferanaselva.com.br