Conforme a Lei das Locações (8.245/90) o locatário (ou inquilino) precisa dar uma garantia para o dono do imóvel (locador). Essa regra vale tanto para o
Conforme a Lei das Locações (8.245/90) o locatário (ou inquilino) precisa dar uma garantia para o dono do imóvel (locador). Essa regra vale tanto para o aluguel de imóveis residenciais (para moradia) como para comerciais (lojas, escritórios etc).
A Lei das Locações prevê três opções de garantia: um depósito antecipado, um seguro fiança ou um fiador.
- O depósito antecipado é limitado ao valor de três vezes as obrigações de pagamento (aluguel, impostos e taxas somados). É mais comum ser aceito em locações residenciais, com valor de aluguel baixo ou por temporada (até 90 dias).
- O seguro fiança costuma ter um custo mais alto, pois inclui as taxas da seguradora. Geralmente é exigida renda mensal familiar de cerca de três vezes o valor das obrigações. Além do seguro fiança, os bancos costumam emitir como garantia de aluguel uma Carta de Fiança. Essa é outra modalidade de garantia, geralmente concedida para grandes empresas porque o custo é bastante elevado. A carta de fiança segue a mesma lógica e procedimento do seguro fiança. Se o inquilino não pagar, o banco assume os pagamentos e cobra do inquilino.
- O fiador é uma pessoa que poderá ser cobrada, juntamente com o inquilino, se ele não cumprir suas obrigações. Geralmente é também uma pessoa física. Neste caso, em geral, o locador (dono do imóvel) exige que o fiador indique um imóvel para servir como garantia. Portanto, se o locatário não pagar o aluguel, IPTU ou outras taxas, o dono do imóvel pode cobrar do fiador. Assim, o dono do imóvel precisa ter alguma segurança de que o locatário e o fiador têm capacidade de pagar. Para ter essa garantia, ele pode exigir que o fiador indique um imóvel para ser penhorado em caso de falta de pagamento. A venda (leilão) do imóvel deve garantir o pagamento da dívida.
O empreendedor é o seu próprio avalista
O que muda para os pequenos empreendedores que querem abrir o seu negócio? Geralmente eles acabam se tornando o seu próprio fiador ou avalista. Como isso acontece? No contrato de aluguel, o inquilino é a pessoa jurídica, ou seja, o CNPJ do empreendedor. Eles não possuem recursos para pagar as altas taxas dos seguros fiança ou contratar uma carta de fiança bancária.
Então, assinam o contrato de aluguel como fiadores ou avalistas na locação do estabelecimento comercial do seu próprio negócio. Para isso, precisam dar em garantia um imóvel, ou seja, indicar um patrimônio que demonstre capacidade financeira. É aí que muitas vezes indicam a sua própria casa.
Bem de família é impenhorável
Você já ouviu essa frase? Sabe de onde ela vem? Eu explico! Existe uma regra, prevista na Lei 8.009/90, segundo a qual o imóvel residencial de moradia da família é impenhorável. Assim, não pode ser usado para quitação de nenhum tipo de dívida: civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de qualquer natureza. Seja ela contraída pelo casal, pelos pais ou pelos filhos que morarem nela, salvo nas hipóteses previstas na própria lei. E a garantia de aluguel não é uma das hipóteses de exceção. Essa lei visa proteger a residência da família. Para que ela não fique sem ter onde morar em caso de dívidas.
Por conta dessa lei, os locatários passaram a exigir que o fiador indique que possui dois imóveis em seu nome. Além do bem de família, sua residência, ele deve ter outro, que poderá ser leiloado para quitar dívidas do inquilino. Com isso, a vida do inquilino que quer alugar um imóvel ficou mais difícil. Contudo, o risco de aceitar apenas um imóvel é do locador.
O que a decisão do STF muda?
A decisão proferida em fevereiro deste ano não foi exatamente uma novidade. Ela repetiu duas decisões anteriores. Contudo, com isso, solidificou o entendimento. Ou seja, criou uma tendência de julgamento. Novos casos devem ser julgados conforme o mesmo entendimento.
Para o STF, o bem de família de fiador em contrato de locação é penhorável, menos nas locações comerciais. Essa foi a decisão da Ministra Carmen Lúcia que suspendeu a penhora de uma residência que garantia uma locação comercial. Ela se baseou em duas decisões anteriores do Tribunal. Em uma delas, o Ministro Edson Fachin foi o Relator do julgamento. Na outra, a Relatora foi a Ministra Rosa Weber.
De acordo com esse entendimento, o fiador de imóvel residencial pode ter sua residência leiloada para quitar dívida de inquilino. Mas o fiador de imóvel comercial não pode. A explicação é que não se deve exigir sacrifício do bem de moradia do fiador para satisfazer crédito do locador ou estimular a livre iniciativa. O fiador estaria sofrendo consequências desproporcionais em detrimento do real devedor.
O curioso é que:
- Se o próprio empreendedor é fiador na locação de sua loja, sua residência não pode ser leiloada. Não será usada para quitar dívida de aluguel da loja. O locador fica com o prejuízo.
- Se o empreendedor mora em casa alugada, a residência do fiador pode ser leiloada para quitar sua dívida de aluguel. O fiador fica com o prejuízo.
O real devedor acaba sendo beneficiado! Por isso nunca recomendamos a ninguém que aceite ser fiador de outras pessoas!
Na prática o problema será outro!
A partir de agora o pequeno empreendedor terá mais dificuldade para conseguir alugar um imóvel para o seu negócio. Os locadores podem não aceitar seu único imóvel como garantia, já que não pode ser leiloado para quitar dívidas. Muitos contratos de locação comercial podem não ser renovados por conta desse novo entendimento.
E aí, todos perdem. Mais imóveis podem ficar fechados. Donos de imóveis perdem dinheiro deixando de alugar suas propriedades por medo de assumir o risco. Investidores em imóveis ficam desestimulados em investir (comprar) em imóveis para disponibilizar para locação comercial. Menos lojas deixam de ser construídas. Menos empregos e renda são gerados. E o dinheiro deixa de circular.
Perde o pequeno empreendedor, porque perde uma alternativa de garantia para abrir o seu negócio. Perdem os grandes investidores imobiliários. E perde a construção civil. Num período em que a economia precisa voltar a crescer, um martelo batido no Supremo Tribunal Federal pode adiar ainda mais a recuperação.