Novas regras para negociação de dívidas de consumidores superendividados esperada há quase 10 anos são uma nova vitória.
Após quase 10 anos em tramitação, um projeto de lei que propõe mudanças no Código de Defesa do Consumidor foi sancionada, e transformada em Lei, no início deste mês pelo Presidente da República. A Lei 14.181 altera o Código de Defesa do Consumidor e cria novos capítulos para:
- Prevenir e combater superendividamento dos consumidores;
- Criar regras sobre o crédito responsável e a educação financeira do consumidor;
- Instituir procedimento para negociação de dívidas do consumidor superendividado.
Desde 2019, aqui na coluna, já falamos sobre superendividamento e a expectativa da aprovação da lei para proteção dos superendividados. O superendividamento das famílias brasileiras já é visto como um problema social. Atualmente, mais de 60 milhões de brasileiros estão endividados e quase a metade deles estão superendividados. Isso quer dizer que não conseguem pagar as dívidas e se manter.
O que leva ao superendividamento?
Ter dívidas não é exatamente o principal problema. Ele se agrava quando toma proporções tão grandes que sai do controle. O superendividamento acontece quando se torna impossível pagar todas as dívidas. Veja abaixo algumas situações que costumam levar ao superendividamento:
- Perda da renda pela perda do emprego ou aposentadoria (corte de receita) sem ajuste no padrão de vida;
- Contratação de empréstimos consecutivos que se tornam impagáveis;
- Oferta fácil de empréstimos a partir de créditos pré-aprovados nas contas correntes (o cheque-especial);
- Oferta ampla de empréstimos consignados, principalmente para idosos;
- Falta de planejamento e de controle sobre a renda;
- Mal uso do cartão de crédito. Gasto acima do que consegue pagar mensalmente, parcelamento das faturas ou pagamento do valor mínimo (crédito rotativo);
- Manter um padrão de consumo acima dos ganhos e rendimento;
- Fazer investimentos de alto risco que resultam em grande prejuízo;
- Empreender sem sucesso e acumular prejuízos.
O que mudou na Lei?
A lei não limitou a oferta de crédito como as entidades de proteção aos consumidores esperavam. Ela não vetou termos como “sem juros” ou “com taxa zero” na publicidade dos bancos e financeiras. Também não limitou a soma das parcelas reservadas ao pagamento de empréstimo consignado em 30% da remuneração mensal do cliente. E não concedeu o prazo de 7 dias para desistir do empréstimo consignado. Esses também eram desejos de instituições de defesa dos consumidores. Contudo, sem dúvidas, as mudanças no Código de Defesa do Consumidor trouxeram um avanço enorme na proteção dos consumidores. Elas representam um grande passo no objetivo de prevenir os cidadãos contra altos índices de endividamento.
De acordo com o Instituto de Defesa dos Consumidores – IDEC, entre as novas regras estão as seguintes novidades:
- os consumidores terão um prazo de até 5 anos para pagar suas dívidas com a apresentação de um plano de pagamentos;
- direito de negociar com todos os credores ao mesmo tempo, com garantia de um “mínimo existencial” reservado para despesas básicas;
- instituições financeiras ficam proibidas de assediar ou pressionar consumidores para contratação de empréstimos.
No caso dos consumidores superendividados é comum que toda a renda fique comprometida com o pagamento das dívidas. Agora, com as mudanças trazidas pela nova lei, uma parcela mínima da renda fica garantida para o sustento próprio. É o mínimo existencial.
A possibilidade de negociar dívidas com todos os credores ao mesmo tempo, cria uma espécie de “recuperação judicial dos cidadãos”. O objetivo é buscar um acordo mais justo para os consumidores, semelhante ao que as empresas fazem quando admitem falência.
Assim, os superendividados deverão apresentar um plano de pagamento parcelando suas dívidas em até 5 anos, resguardando o mínimo existencial. Se o consumidor e os credores não chegarem a um acordo sobre essa proposta, o juiz poderá interferir. Ele poderá determinar a elaboração de um plano de pagamento judicial obrigatório, estabelecendo os prazos e formas de pagamento. O mínimo existencial sempre será assegurado evitando contrair novas dívidas para pagamento de despesas básicas como energia, alimentação e moradia.
Agora é mais sério!
A transparência das informações sobre os riscos da contratação de crédito é obrigatória. Bancos e financeiras estão proibidos de ocultar os riscos da contratação de um crédito, ou seja, de um empréstimo. As ações das instituições financeiras devem ser realizadas com clareza e transparência ao consumidor durante todo o processo de contratação. Eles devem informar previamente e adequadamente, de forma clara, sobre:
- Taxas, tarifas, percentual de juros, forma de pagamento, encargos pelo pagamento em atraso, ou seja, o Custo efetivo Total – CET do empréstimo;
- Prazos devem ser explicados em detalhes. A validade da oferta de crédito será de 02 dias. Isso assegura um tempo para o cliente pensar se quer mesmo fazer o empréstimo ou compra parcelada;
- Multas que podem ser cobradas pelo atraso no pagamento de uma ou mais parcelas;
- Opção de pagamento antecipado e suas condições, como por exemplo, desconto dos juros;
- Resultado de consulta aos órgãos de proteção ao crédito como SPC e Serasa. Elas agora são obrigatórias, bem como a avaliação da situação financeira do consumidor. Não há mais justificativa para pesar nos juros por dispensa dessa análise;
- Um contrato com todas as condições da operação deve ser entregue ou enviado para o consumidor, descrevendo todas essas informações.
Portanto, é obrigatório informar previamente sobre todos os encargos e riscos da contratação do empréstimo; compras a prazo; e serviços de prestação continuada (como financiamentos de imóveis). Gerentes de banco não poderão abordar clientes informando que existe um valor disponível, sem deixar claro que se trata de empréstimo. Ou seja, que ele estará contraindo uma dívida!
Além, disso, pressionar clientes para os levarem a contratar empréstimos é ilegal. Bancos e financeiras não podem oferecer prêmios e sistemas de crédito, especialmente para idosos e analfabetos. O cliente poderá inclusive denunciar o banco por assédio.
Recebeu ligação de telemarketing oferecendo “uma vantagem para receber um valor disponível”? Reclame com o seu gerente, denuncie para o serviço de atendimento ao cliente e para a ouvidoria do próprio banco. Anote todos os protocolos para poder fazer uma reclamação na ouvidoria do Banco Central (Bacen), que fiscaliza os bancos. Saiba mais sobre como reclamar no Bacen clicando aqui!
O que fazer se o banco não cumprir a lei?
Se já entrou em contato com o gerente; serviço de atendimento aos clientes e com a ouvidoria do banco e não conseguiu negociar:
- Registre uma reclamação através do SNDC (Serviço Nacional de Defesa do Consumidor) que engloba os canais consumidor.gov, Procons e Defensorias Públicas;
- Registre sua reclamação também na ouvidoria do Bacen;
Agora a lei prevê penalidades para bancos e instituições financeiras que não cumprirem todas essas obrigações. Inclusive, a ausência de representante para negociar com o consumidor, quando convocado, pode resultar em penalidades impostas judicialmente. A exigibilidade do débito pode ficar suspensa e as cobranças de multas por atraso no pagamento podem ser interrompidas. Além disso, o juiz pode obrigar a ampliar o prazo para pagamento da dúvida sem aumento dos encargos.
Como sempre dissemos aqui em nossa Coluna: exija seus direitos! Agora, finalmente, depois de tanto tempo, a lei foi melhorada para proteger você consumidor e cliente de banco!